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terça-feira, 21 de junho de 2011

E este é o Rosto de Deus: seu amor misericordioso

Visita Pastoral à Diocese de San Marino-Montefeltro

Concelebração Eucarística

Homilia do Santo Padre Bento XVI

Estádio de Serravalle – República de San Marino
Domingo, 19 de junho de 2011
Solenidade da Santíssima Trindade

Caros irmãos e irmãs,
É grande a minha alegria ao poder partir convosco o pão da Palavra de Deus e da Eucaristia e poder dirigir a vós, caros san-marinenses, a minha mais cordial saudação. Dirijo um pensamento especial aos Capitães Regentes e às outras autoridades políticas e civis presentes nesta celebração eucarística; saúdo com afeto o vosso Bispo, Dom Luigi Negri, que agradeço pelas cordiais palavras a mim dirigidas, e, com ele, todos os sacerdotes e fiéis da diocese de San Marino-Montefeltro; saúdo a cada um de vós e vos expresso o meu vivo reconhecimento pela cordialidade e o afeto com o qual me acolhestes. Vim para compartilhar convosco alegrias e esperanças, fadigas e compromissos, ideais e aspirações desta Comunidade diocesana. Sei que também aqui não faltam dificuldades, problemas e preocupações. A todos quero assegurar a minha proximidade e a minha recordação na oração, à qual uno o encorajamento para perseverarem no testemunho dos valores humanos e cristãos, tão profundamente radicados na fé e na história deste território e da sua população, com a sua fé resistente como pedra da qual falou Sua Excelência.
Hoje, celebramos a festa da Santíssima Trindade: Deus Pai e Filho e Espírito Santo, festa de Deus, do centro da nossa fé. Quando se pensa na Trindade, quase sempre vem em mente o aspecto do mistério: são Três e são Um, um só Deus em três Pessoas. Na realidade, Deus não pode ser outra coisa senão um mistério para nós, na sua grandeza, e todavia Ele se revelou: podemos conhecê-Lo no seu Filho, e assim também conhecer o Pai e o Espírito Santo. A liturgia de hoje, pelo contrário, chama a nossa atenção não tanto para o mistério, mas para a realidade de amor que está contida neste primeiro e supremo mistério da nossa fé. O Pai, o Filho e o Espírito Santo são um, porque amor e amor é a força vivificante absoluta, a unidade criada pelo amor é mais unidade do que uma unidade puramente física. O Pai dá tudo ao Filho; o Filho recebe tudo do Pai com reconhecimento; e o Espírito Santo é como que o fruto deste amor recíproco do Pai e do Filho. Os textos da Santa Missa de hoje falam de Deus e, por isso, falam de amor; não se dedicam tanto ao mistério das três Pessoas, mas sobre o amor que constitui a sua substância e a unidade e trindade ao mesmo tempo.
O primeiro trecho que escutamos é tirado do Livro do Êxodo – sobre ele eu me dediquei numa recente Catequese da quarta-feira – e é surpreendente que a revelação do amor de Deus aconteça depois de um gravíssimo pecado do povo. Acabou de ser concluído o pacto de aliança junto ao monte Sinai, e o povo já peca contra a fidelidade. A ausência de Moisés se prolonga e o povo diz: “Mas, onde está Moisés, onde está o seu Deus?”, e pede a Aarão que lhe faça um deus que seja visível, acessível, manobrável, ao alcance do homem, ao invés daquele misterioso Deus invisível, distante. Aarão consente e prepara um bezerro de ouro. Descendo do Sinai, Moisés vê aquilo que aconteceu e quebra as tábuas da aliança, que já era partida, quebrada, duas pedras sobre as quais estavam escritas “Dez Palavras”, o conteúdo concreto do pacto com Deus. Tudo parece perdido, a amizade, de repente, desde o início, já partida. E no entanto, não obstante este gravíssimo pecado do povo, Deus, por intercessão de Moisés, decide perdoar e convida Moisés a subir outra vez ao monte para receber de novo a sua lei, os dez Mandamentos e renovar o pacto. Moisés pede, então, a Deus que se revele, que lhe permitisse ver o seu rosto. Mas Deus não mostra o rosto, revela sim o seu ser pleno de bondade com estas palavras: “Senhor, Senhor! Deus misericordioso e clemente, lento na ira e rico de amor e de fidelidade” (Ex 34, 6). E este é o Rosto de Deus. Esta autodefinição de Deus manifesta o seu amor misericordioso: um amor que vence o pecado, o cobre, o elimina. E podemos estar seguros desta bondade que não nos deixa. Não pode haver revelação mais clara. Temos um Deus que renuncia a destruir o pecador e que quer manifestar o seu amor de maneira ainda mais profunda e surpreendente exatamente diante do pecador, para oferecer a possibilidade da conversão e do perdão.
O Evangelho completa esta revelação, que escutamos na primeira leitura, porque indica até que ponto Deus mostrou a sua misericórdia. O evangelista João faz referência a esta expressão de Jesus: “Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16). No mundo há o mal, o egoísmo, a maldade e Deus poderia vir para julgar este mundo, para destruir o mal, para castigar aqueles que agem nas trevas. Ao contrário, Ele demonstra amar o mundo, amar o homem, não obstante o seu pecado, e envia aquilo que tem de mais precioso: o seu Filho unigênito. E não só O envia, mas o doa ao mundo. Jesus é o Filho de Deus que é nascido para nós, que viveu para nós, que curou os doentes, perdoou os pecados, acolheu a todos. Respondendo ao amor que vem do Pai, o Filho deu a sua vida por nós: na cruz, o amor misericordioso de Deus atinge o seu ápice. E é na cruz que o Filho de Deus nos obtém a participação na vida eterna, que nos é comunicada com o dom do Espírito Santo. Assim, no mistério da cruz, estão presentes as três Pessoas divinas: o Pai, que dá o seu Filho unigênito para a salvação do mundo; o Filho, que realize até ao fim o desígnio do Pai; o Espírito Santo – derramado por Jesus no momento da morte – que vem para nos tornar partícipes da vida divina, para transformar a nossa existência, para que seja animada pelo amor divino.
Caros irmãos e irmãs, a fé no Deus trinitário caracterizou também esta Igreja de San Marino-Montefeltro, no curso da sua história antiga e gloriosa. A evangelização desta terra é atribuída aos Santos pedreiros Marino e Leão, os quais, na metade do século III depois de Cristo, teriam desembarcado em Rímini, vindos da Dalmácia. Por causa de sua santidade de vida foram consagrados um como sacerdote e outro como diácono do Bispo Gaudêncio e foram por ele enviados ao interior, um ao monte Feretro, que depois assumiu o nome de San Leo, e outro ao monte Titano, que depois tomou o nome de San Marino. Para além das questões históricas – que não é nossa tarefa aprofundar – interessa afirmar como Marino e Leão trouxeram ao contexto desta realidade local, com a fé no Deus revelado em Jesus Cristo, perspectivas e valores novos, determinando o nascimento de uma cultura e de uma civilização centrada na pessoa humana, imagem de Deus e, por isso, portadora de direitos precedentes a toda legislação humana. A variedade das diversas etnias – romanos, godos e depois lombardos – que entravam em contato entre si, algumas vezes até de modo conflituoso, encontraram na referência comum à fé um fator poderoso de edificação ética, cultural, social e, de algum modo, política. Era evidente a seus olhos que não era possível ter como realizado um projeto de civilização enquanto todos os componentes do povo não se tivesse tornado uma comunidade cristã viva e bem estruturada e edificada sobre a fé no Deus Trinitário. Com razão, portanto, se pode dizer que a riqueza deste povo, a vossa riqueza, caros san-marinenses, foi e é a fé, e que esta fé criou uma civilização verdadeiramente única. Ao lado da fé, é preciso também recordar, a absoluta fidelidade ao Bispo de Roma, ao qual esta Igreja sempre olhou com devoção e afeto; como mesmo a atenção demonstrada pela grande tradição da Igreja oriental e a profunda devoção pela Virgem Maria.
Vós sois justamente orgulhosos e gratos pelo que o Espírito Santo operou através dos séculos na vossa Igreja. Mas, vós sabeis também que o melhor modo para apreciar uma herança é cultivá-la e enriquecê-la. Na realidade, vós sois chamados a desenvolver este precioso depósito num momento entre os mais decisivos da história. Hoje, a vossa missão se encontra no confrontar-se com profundas e rápidas transformações culturais, sociais, econômicas, políticas, que determinaram novas orientações e modificaram mentalidades, costumes e sensibilidades. Também aqui, de fato, como em outros lugares, não faltam dificuldades e obstáculos, devidos sobretudo a modelos hedonistas que obscurecem a mente e arriscam anular toda moralidade. Insinuou-se a tentação de achar que a riqueza do homem não seja a fé, mas o seu poder pessoal e social, a sua inteligência, a sua cultura e a sua capacidade de manipulação científica, tecnológica e social da realidade. Assim, mesmo nestas terras, começou-se a substituir a fé e os valores cristãos com presumidas riquezas, que se revelam, no fim, inconsistentes e incapazes de manter a grande promessa do verdadeiro, do bom, do belo e do justo que, por séculos, os vossos antepassados identificaram com a experiência da fé. Não são, pois, esquecidas a crise de não poucas famílias, agravada pela difusa fragilidade psicológica e espiritual dos cônjuges, como também a dificuldade experimentada por muitos educadores na obtenção da continuidade formativa dos jovens, condicionados por múltiplas precariedades, a primeira das quais pode ser apontada como a do papel social e da possibilidade de trabalho.
Caros amigos! Conheço bem o compromisso de cada componente desta Igreja particular na promoção da vida cristã nos seus vários aspectos. Exorto a todos os fiéis a serem como fermento no mundo, mostrando-vos, tanto em Montefeltro como em San Marino, cristãos presentes, empreendedores e coerentes. Que os Sacerdotes, os Religiosos e as Religiosas vivam sempre na mais cordial e ativa comunhão eclesial, ajudando e escutando o Pastor diocesano. Também junto de vós se percebe a urgência de uma retomada das vocações sacerdotais e de consagração especial: apelo às famílias e aos jovens, para que abram o espírito para uma resposta pronta ao chamado do Senhor. Nunca nos arrependemos de ser generosos com Deus! A vós leigos, recomendo que vos empenheis ativamente na comunidade, de forma que, ao lado de vossas peculiares tarefas civis, políticas, sociais e culturais, possais encontrar tempo e disponibilidade para a vida da fé, a vida pastoral. Caros san-marinenses, permanecei fortemente fiéis ao patrimônio construído nos séculos sob o impulso dos vossos grandes Padroeiros, Marino e Leão. Invoco a bênção de Deus sobre vosso caminho de hoje e de amanhã e recomendo todos “à graça do Senhor Jesus Cristo, ao amor de Deus e à comunhão do Espírito Santo” (2Cor 13, 11). Amém!

* Extraído do site do Vaticano, do dia 19 de junho de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

domingo, 19 de junho de 2011

Comentário ao evangelho do dia

Solenidade da Santíssima Trindade

1ª Leitura - Ex 34,4b-6.8-9
Naqueles dias, Moisés levantou-se, quando ainda fazia noite, e subiu ao monte Sinai, como o Senhor lhe havia mandado, levando consigo as duas tábuas de pedra. O Senhor desceu na nuvem e permaneceu com Moisés, e este invocou o nome do Senhor. Enquanto o Senhor passava diante dele Moisés gritou: "Senhor, Senhor! Deus misericordioso e clemente, paciente, rico em bondade e fiel". Imediatamente, Moisés curvou-se até o chão e, prostrado por terra, disse: "Senhor, se é verdade que gozo de teu favor, peço-te, caminha conosco; embora este seja um povo de cabeça dura, perdoa nossas culpas e nossos pecados e acolhe-nos como propriedade tua".

2ª Leitura - 2Cor 13,11-13
Irmãos, alegrai-vos, trabalhai no vosso aperfeiçoamento, encorajai-vos, cultivai a concórdia, vivei em paz, e o Deus do amor e da paz estará convosco. Saudai-vos uns aos outros com o beijo santo. Todos os santos vos saúdam. A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós.

Evangelho - Jo 3,16-18
Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna. De fato, Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele. Quem nele crê, não é condenado, mas quem não crê, já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho unigênito. 

Comentário feito por Santo Atanásio (295-373)
Bispo de Alexandria, Doutor da Igreja

Insensatos, que não cessais de revelar-vos indiscretos na procura da Trindade, sem vos contentardes em acreditar tão somente que Ela existe, tal como vos orienta o Apóstolo, que diz: “quem se aproxima de Deus tem de acreditar que Ele existe e recompensa aqueles que O procuram” (Heb 11,6). Que ninguém se ocupe de questões supérfluas, mas se contente em apreender o conteúdo das Escrituras, [...] que dizem que o Pai é fonte — “o Meu povo abandonou-Me, a Mim, nascente de águas vivas” (Jr 2,13); “Abandonaste a fonte da sabedoria!” (Br 3,12) — e luz, segundo João: “Deus é luz” (1Jo 1,5). O Filho, com efeito, em relação a essa fonte, é rio, de acordo com o salmo: “Enches, a transbordar, o rio caudaloso” (Sl 65 /64,10), e em relação à luz é resplendor, quando Paulo diz que “é resplendor da Sua glória e imagem fiel da Sua substância” (Heb 1,3). Assim sendo, o Pai é luz, e o Filho o Seu resplendor. [...] E é no Filho que somos iluminados pelo Espírito, como diz também Paulo: “que o Pai vos dê o Espírito de sabedoria e vo-Lo revele, para o conhecerdes, e sejam iluminados os olhos do vosso coração” (Ef 1,17-18). É, porém, Cristo quem nos ilumina nEle quando somos iluminados pelo Espírito, pois a Escritura diz: “O Verbo era a Luz verdadeira que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina” (Jo 1,9). Para além disso, sendo o Pai fonte e Cristo rio, é dito igualmente que bebemos do Espírito: “e todos bebemos de um só Espírito” (1Cor 12,13). Dessedentados, pois, pelo Espírito, é de Cristo que bebemos, porquanto bebemos “de um rochedo espiritual que os seguia, e esse rochedo era Cristo” (1Cor 10,4).  Ora, sendo o Pai o “único Deus sábio” (Rm 16,27), o Filho é a Sua sabedoria, porque “Cristo é poder e sabedoria de Deus” (1 Cor 1,24). Por conseguinte, ao recebermos o Espírito de sabedoria, recebemos o Filho e adquirimos assim a Sua sabedoria. [...] O Filho é a vida, pois Ele disse: “Eu sou a Vida” (Jo 14,6). Mas também se diz na Escritura que somos vivificados pelo Espírito quando Paulo nos diz que “o Pai, que ressuscitou Cristo de entre os mortos, também dará vida aos vossos corpos mortais, por meio do Seu Espírito que habita em vós” (Rm 8,11). Mas ao sermos vivificados pelo Espírito, é Cristo que Se faz vida em nós: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20). Existindo, assim, no seio da Trindade uma tal correspondência e uma tal unidade, quem poderá separar o Filho do Pai, e o Espírito do Filho, ou do Pai? [...] O Mistério de Deus não é concedido ao nosso ser com discursos eloquentes, mas pela fé e por preces respeitosas.