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quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Jovens - arraigados e edificados em Cristo - manifestem a firmeza da sua fé



Viagem Apostólica a Madri
Por ocasião da XXVI Jornada Mundial da Juventude
18 a 21 de agosto de 2011

Cerimônia de boas-vindas

Discurso do Papa Bento XVI

Aeroporto Internacional de Madri Barajas
Quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Majestades,
Senhor Cardeal Arcebispo de Madri,
Senhores Cardeais,
Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio,
Distintas Autoridades Nacionais, Autonômicas e Locais, 
Querido povo de Madri e da Espanha inteira!
Obrigado, Majestade, pela sua presença aqui, juntamente com a Rainha, e pelas palavras deferentes e amigas de boas-vindas que me dirigiu. Palavras que me fazem reviver as inesquecíveis demonstrações de simpatia recebidas nas minhas anteriores visitas apostólicas a Espanha, e de modo muito particular na minha recente viagem a Santiago de Compostela e a Barcelona. Saúdo cordialmente a todos vós que vos encontrais reunidos aqui em Barajas, e todos os que acompanham esta cerimônia através do rádio e da televisão. Uma menção muito agradecida desejo fazer aos que, com tanto zelo e dedicação, nas instituições eclesiais e civis, contribuíram com o seu esforço e trabalho para que esta Jornada Mundial da Juventude em Madri decorra em boa ordem e se cubra de abundantes frutos.
Desejo também agradecer de todo o coração a hospitalidade de tantas famílias, paróquias, colégios e outras instituições que acolheram os jovens vindos de todo o mundo, primeiro nas diversas regiões e cidades da Espanha e agora nesta grande cidade de Madri, cosmopolita e sempre de portas abertas.
Venho aqui para me encontrar com milhares de jovens de todo o mundo, católicos, interessados por Cristo ou à procura da verdade que dê sentido genuíno à sua existência. Chego como Sucessor de Pedro para confirmar a todos na fé, vivendo alguns dias de intensa atividade pastoral para anunciar que Jesus Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida. Para animar o compromisso de construir o Reino de Deus no mundo, no meio de nós. Para exortar os jovens a se encontrarem pessoalmente com Cristo Amigo e, assim, radicados na Sua Pessoa, converterem-se em Seus fiéis seguidores e valorosas testemunhas.
Esta multidão de jovens que veio a Madri... por que e para que vieram? Embora a resposta deva ser dada por eles mesmos, pode-se, no entanto, pensar que desejam escutar a Palavra de Deus, como lhes foi proposto no lema para esta Jornada Mundial da Juventude, de tal maneira que, arraigados e edificados em Cristo, manifestem a firmeza da sua fé.
Muitos deles talvez tenham ouvido a voz de Deus apenas como um leve sussurro, impelindo-os a procurá-Lo mais diligentemente e a partilhar com outros a experiência da força que tem na suas vidas. Esta descoberta do Deus vivo revigora os jovens e abre os seus olhos para os desafios do mundo onde vivem, com as suas possibilidades e limitações. Veem a superficialidade, o consumismo e o hedonismo imperantes, tanta banalidade na vivência da sexualidade, tanto egoísmo, tanta corrupção. E sabem que, sem Deus, seria difícil afrontar estes desafios e ser verdadeiramente felizes, colocando para isso todo o entusiasmo na consecução de uma vida autêntica. Mas, com Ele a seu lado, terão luz para caminhar e razões para esperar, não se detendo nem mesmo diante dos ideais mais altos, que hão de motivar os seus generosos compromissos para a construção de uma sociedade onde se respeite a dignidade humana e uma efetiva fraternidade. Aqui, nesta Jornada, eles têm uma ocasião privilegiada para colocar em comum as suas aspirações, trocar reciprocamente a riqueza das suas culturas e experiências, animar-se mutuamente num caminho de fé e de vida, no qual alguns se julgam sozinhos ou ignorados nos seus ambientes cotidianos. Mas não! Não estão sozinhos. Muitos da sua idade partilham os mesmos propósitos deles e, confiando inteiramente em Cristo, sabem que têm realmente um futuro à sua frente e não temem os compromissos decisivos que preenchem toda a vida. Por isso me dá imensa alegria poder escutá-los, rezarmos juntos e celebrar a Eucaristia com eles. A Jornada Mundial da Juventude traz-nos uma mensagem de esperança, como uma brisa de ar puro e juvenil, com aromas renovadores que nos enchem de confiança face ao amanhã da Igreja e do mundo.
Não faltam, certamente, dificuldades. Subsistem tensões e confrontos em aberto em muitos lugares do mundo, inclusive com derramamento de sangue. A justiça e o sublime valor da pessoa humana facilmente se curvam a interesses egoístas, materiais e ideológicos. Nem sempre se respeita, como é devido, o meio ambiente e a natureza, que Deus criou com tanto amor. Além disso, muitos jovens olham com preocupação para o futuro diante da dificuldade de encontrar um trabalho digno, ou por terem perdido o emprego, ou por ser este muito precário. Há outros que precisam de prevenção para não cair na rede das drogas, ou de uma ajuda eficaz, caso desgraçadamente já tenham caído nela. Há muitos que, por causa da sua fé em Cristo, são vítimas de discriminação, que gera o desprezo e a perseguição, aberta ou dissimulada, que sofrem em determinadas regiões e países. Molestam-lhes querendo afastá-los dEle, privando-os dos sinais da Sua presença na vida pública e silenciando mesmo o Seu santo Nome. Mas, eu volto a dizer aos jovens, com todas as forças do meu coração: Que nada e ninguém vos tire a paz; não vos envergonheis do Senhor. Ele fez questão de fazer-Se igual a nós e experimentar as nossas angústias para levá-las a Deus, e assim nos salvou.
Neste contexto, é urgente ajudar os jovens discípulos de Jesus a permanecerem firmes na fé e a assumirem a maravilhosa aventura de anunciá-la e testemunhá-la abertamente com a sua própria vida. Um testemunho corajoso e cheio de amor pelo homem irmão, ao mesmo tempo decidido e prudente, sem ocultar a própria identidade cristã, num clima de respeitosa convivência com outras legítimas opções e exigindo ao mesmo tempo o devido respeito pelas próprias.
Majestades, ao renovar-lhes o meu agradecimento pelas deferentes boas-vindas que me proporcionaram, desejo exprimir também o meu apreço e proximidade a todos os povos da Espanha, bem como a minha admiração por um país tão rico de história e cultura, pela vitalidade da sua fé, que frutificou em tantos santos e santas de todas as épocas, em numerosos homens e mulheres que, deixando a sua terra, levaram o Evangelho a todos os cantos do mundo, e em pessoas retas, solidárias e bondosas por todo o seu território. Trata-se de um grande tesouro, que vale a pena, sem dúvida, cuidar com atitude construtiva, para o bem comum de hoje e para oferecer um horizonte luminoso ao porvir das novas gerações. Embora atualmente haja motivos de preocupação, maior é a solicitude dos espanhóis pela sua superação com esse dinamismo que os caracteriza e para o qual contribuem grandemente as suas profundas raízes cristãs, muito fecundas ao longo dos séculos.
Daqui saúdo com grande cordialidade todos os queridos amigos espanhóis e madrilenos, e todos os que vieram de outras terras. Durante estes dias estarei junto de vós, mas tendo também muito presente todos os jovens do mundo, particularmente os que atravessam provações de diversa natureza. Ao confiar este encontro à Santíssima Virgem Maria e à intercessão dos Santos protetores desta Jornada, peço a Deus que abençoe e proteja sempre os filhos da Espanha. Muito obrigado.

* Extraído do site do Vaticano, do dia 18 de agosto de 2011. Revisado e adaptado por Paulo R. A. Pacheco.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Quaresma XVII


"A lei da nossa vida pode ser resumida no axioma 'seja o que você é'." (T. Merton)

Com prazer faço a vossa vontade, guardo em meu coração vossa lei! 
Sl 39(40), 8-9

* Extraído da Sociedade dos Amigos Fraternos de Thomas Merton.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Liberdade religiosa, caminho para a paz - 03

MENSAGEM DE SUA SANTIDADE BENTO XVI
PARA A CELEBRAÇÃO DO XLIV DIA MUNDIAL DA PAZ

1 DE JANEIRO DE 2011

LIBERDADE RELIGIOSA, CAMINHO PARA A PAZ

A dimensão pública da religião 
6. Embora movendo-se a partir da esfera pessoal, a liberdade religiosa – como qualquer outra liberdade – realiza-se na relação com os outros. Uma liberdade sem relação não é liberdade perfeita. Também a liberdade religiosa não se esgota na dimensão individual, mas realiza-se na própria comunidade e na sociedade, coerentemente com o ser relacional da pessoa e com a natureza pública da religião.
O relacionamento é uma componente decisiva da liberdade religiosa, que impele as comunidades dos crentes a praticarem a solidariedade em prol do bem comum. Cada pessoa permanece única e irrepetível e, ao mesmo tempo, completa-se e realiza-se plenamente nesta dimensão comunitária.
Inegável é a contribuição que as religiões prestam à sociedade. São numerosas as instituições caritativas e culturais que atestam o papel construtivo dos crentes na vida social. Ainda mais importante é a contribuição ética da religião no âmbito político. Tal contribuição não deveria ser marginalizada ou proibida, mas vista como válida ajuda para a promoção do bem comum. Nesta perspectiva, é preciso mencionar a dimensão religiosa da cultura, tecida através dos séculos graças às contribuições sociais e sobretudo éticas da religião. Tal dimensão não constitui de modo algum uma discriminação daqueles que não partilham a sua crença, mas antes reforça a coesão social, a integração e a solidariedade.

Liberdade religiosa, força de liberdade e de civilização:
os perigos da sua instrumentalização
7. A instrumentalização da liberdade religiosa para mascarar interesses ocultos, como por exemplo a subversão da ordem constituída, a apropriação de recursos ou a manutenção do poder por parte de um grupo, pode provocar danos enormes às sociedades. O fanatismo, o fundamentalismo, as práticas contrárias à dignidade humana não se podem jamais justificar, e menos ainda o podem ser se realizadas em nome da religião. A profissão de uma religião não pode ser instrumentalizada, nem imposta pela força. Por isso, é necessário que os Estados e as várias comunidades humanas nunca se esqueçam de que a liberdade religiosa é condição para a busca da verdade e que a verdade não se impõe pela violência mas pela "força da própria verdade".[10] Neste sentido, a religião é uma força positiva e propulsora na construção da sociedade civil e política.
Como se pode negar a contribuição das grandes religiões do mundo para o desenvolvimento da civilização? A busca sincera de Deus levou a um respeito maior da dignidade do homem. As comunidades cristãs, com o seu patrimônio de valores e princípios, contribuíram imensamente para a tomada de consciência das pessoas e dos povos a respeito da sua própria identidade e dignidade, bem como para a conquista de instituições democráticas e para a afirmação dos direitos do homem e seus correlativos deveres.
Também hoje, numa sociedade cada vez mais globalizada, os cristãos são chamados – não só através de um responsável empenho civil, econômico e político, mas também com o testemunho da própria caridade e fé – a oferecer a sua preciosa contribuição para o árduo e exaltante compromisso em prol da justiça, do desenvolvimento humano integral e do reto ordenamento das realidades humanas. A exclusão da religião da vida pública subtrai a esta um espaço vital que abre para a transcendência. Sem esta experiência primária, revela-se uma tarefa árdua orientar as sociedades para princípios éticos universais e torna-se difícil estabelecer ordenamentos nacionais e internacionais nos quais os direitos e as liberdades fundamentais possam ser plenamente reconhecidos e realizados, como se propõem os objetivos – infelizmente ainda menosprezados ou contestados – da Declaração Universal dos direitos do homem de 1948.

Uma questão de justiça e de civilização:
o fundamentalismo e a hostilidade contra os crentes prejudicam a laicidade positiva dos Estados
8. A mesma determinação, com que são condenadas todas as formas de fanatismo e de fundamentalismo religioso, deve animar também a oposição a todas as formas de hostilidade contra a religião, que limitam o papel público dos crentes na vida civil e política.
Não se pode esquecer que o fundamentalismo religioso e o laicismo são formas reverberadas e extremas de rejeição do legítimo pluralismo e do princípio de laicidade. De fato, ambas absolutizam uma visão redutiva e parcial da pessoa humana, favorecendo formas, no primeiro caso, de integralismo religioso e, no segundo, de racionalismo. A sociedade, que quer impor ou, ao contrário, negar a religião por meio da violência, é injusta para com a pessoa e para com Deus, mas também para consigo mesma. Deus chama a Si a humanidade através de um desígnio de amor, o qual, ao mesmo tempo que implica a pessoa inteira na sua dimensão natural e espiritual, exige que lhe corresponda em termos de liberdade e de responsabilidade, com todo o coração e com todo o próprio ser, individual e comunitário. Sendo assim, também a sociedade, enquanto expressão da pessoa e do conjunto das suas dimensões constitutivas, deve viver e organizar-se de modo a favorecer a sua abertura à transcendência. Por isso mesmo, as leis e as instituições de uma sociedade não podem ser configuradas ignorando a dimensão religiosa dos cidadãos ou de modo que prescindam completamente da mesma; mas devem ser comensuradas – através da obra democrática de cidadãos conscientes da sua alta vocação – ao ser da pessoa, para o poderem favorecer na sua dimensão religiosa. Não sendo esta uma criação do Estado, não pode ser manipulada, antes deve contar com o seu reconhecimento e respeito.
O ordenamento jurídico a todos os níveis, nacional e internacional, quando consente ou tolera o fanatismo religioso ou anti-religioso, falta à sua própria missão, que consiste em tutelar e promover a justiça e o direito de cada um. Tais realidades não podem ser deixadas à mercê do arbítrio do legislador ou da maioria, porque, como já ensinava Cícero, a justiça consiste em algo mais do que um mero ato produtivo da lei e da sua aplicação. A justiça implica reconhecer a cada um a sua dignidade,[11] a qual, sem liberdade religiosa garantida e vivida na sua essência, fica mutilada e ofendida, exposta ao risco de cair sob o predomínio dos ídolos, de bens relativos transformados em absolutos. Tudo isto expõe a sociedade ao risco de totalitarismos políticos e ideológicos, que enfatizam o poder público, ao mesmo tempo que são mortificadas e coarctadas, como se lhe fizessem concorrência, as liberdades de consciência, de pensamento e de religião.

Notas
[10] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Decl. sobre a liberdade religiosa Dignitatis humanae, 1.
[11] Cf. CÍCERO, De inventione, II, 160.

* Retirado do site do Vaticano, do dia 1o de janeiro de 2011. Adaptado por Paulo R. A. Pacheco.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Humm! Qualquer semelhança...

Há quase 80 anos atrás, no dia 10 de fevereiro de 1933, Joseph Goebbels, então futuro Ministro do Povo e da Propaganda do governo nazista, pronunciava o discurso abaixo (traduzido pelo Reinaldo Azevedo e que pode ser lido na íntegra aqui)... 11 dias depois, o adorável Adolf Hitler assumia como Chanceler da Alemanha...
Leiam um trecho do seu discurso... é preciso muito pouco para torná-lo um discurso que cabe muito bem na boca dos "inteliquituais" - nossos Ministros do Povo e da Propaganda (ou, para usar uma imagem bastante conhecida dos leitores de Orwell, Ministros da Verdade) - que assombram nossas universidades... Ai, ai! E a história se repete... e a impressão que tenho é que nada, ou muito pouco, se aprendeu... ou estamos de tal forma anestesiados e vacinados contra a verdade e os fatos que de nada adianta afirmá-los.

Companheiros,
Antes de o encontro começar, gostaria de chamar a atenção para alguns artigos da imprensa de Berlim que asseguram que eu não deveria merecer a atenção das rádios alemãs, uma vez que sou insignificante demais, pequeno demais e mentiroso demais para poder me dirigir ao mundo inteiro.
Nesta noite, vocês testemunharão um evento de massa como nunca aconteceu antes na história da Alemanha e, provavelmente, do mundo.(…)
Quando a imprensa judaica reclama que o movimento Nacional Socialista tem a permissão de falar em todas as rádios alemãs por causa de seu chanceler, podemos responder que só estamos fazendo o que vocês sempre fizeram no passado. Há alguns anos, não falávamos da boca pra fora quando dizíamos que vocês, judeus, são nossos professores e que só queremos ser seus alunos e aprender com vocês. Além disso, é preciso esclarecer que aquilo que esses senhores conseguiram no terreno da política de propaganda durante os últimos 14 anos foi realmente uma porcaria. Apesar de eles controlarem os meios de comunicação, tudo o que conseguiram fazer foi encobrir os escândalos parlamentares, que eram inúteis para formar uma nova base política.(…) Se hoje a imprensa judaica acredita que pode fazer ameaças veladas contra o movimento Nacional-Socialista e acredita que pode burlar nossos meios de defesa, então, não deve continuar mentindo. Um dia nossa paciência vai acabar e calaremos esses judeus insolentes, bocas mentirosas! E se outros jornais judeus acham que podem, agora, mudar para o nosso lado com as suas bandeiras, então só podemos dar uma resposta: “Por favor, não se dêem ao trabalho!”
Ademais, os nossos homens da SA e os companheiros de partido podem se acalmar: a hora do fim do terror vermelho chegará mais cedo do que pensamos. Quem pode negar que a imprensa bolchevique mente quando o [jornal] Die Rote Fahne, este exemplo da insolência judaica, se atreve a afirmar que o nosso camarada Maikowski e o policial Zauritz foram fuzilados por nossos próprios companheiros?
Esta insolência judaica tem mais passado do que terá futuro. Em pouco tempo, ensinaremos os senhores da Karl Liebnecht Haus [sede do Partido Comunista] o que é a morte, como nunca aprenderam antes. Eu só queria acertar as contas com os [nossos] inimigos na imprensa e com os partidos inimigos e dizer-lhes pessoalmente o que quero dizer em todas as rádios alemãs para milhões de pessoas.

Chesterton (2010), numa obra recentemente traduzida para o português - O homem eterno -, numa determinada altura do texto, faz uma longa sequência de argumentação acerca de uma certa tendência dos intelectuais em assumir falácias como se fossem verdades. Obviamente, que não o fazem ingenuamente... Ingênuo seria pensar que o fazem ingenuamente. Segundo ele, infelizmente há uma falácia que é muito fácil de ser assumida como verdadeira: "a falácia da suposição de que, pelo fato de uma ideia ser maior no sentido de mais ampla, ela é, por consequência, maior no sentido de mais fundamental, fixa e certa" (p. 77). Segue-se a essa afirmação um exemplo para ilustrá-la. Mas, podemos nos valer de um exemplo que nos é muito mais próximo: o lulo-petismo e toda a sua verborragia cheia de números acerca das melhorias sociais a que se chegou no país. Uma ideia, por mais ampla que seja, não é mais fundamental, fixa e certa. Converse (falo portanto daqueles com quem se pode conversar... porque há aqueles com quem é impossível um diálogo, visto que sequer levantam a cara da grama) com um petista e se entenderá o que estou dizendo: logo vem uma inundação de números para provar que, para que o miserável venha a ser pessoa, antes é necessário que tenha comida na barriga... Por mais vasta que seja a dedução a que chegam no seu "raciossímio", não passa de uma dedução... não é, portanto, uma verdade! Não é, portanto, nem fundamental, fixa nem certa, porque "embora a contradição possa lhes parecer um paradoxo, isso é exatamente o contrário da verdade. É a realidade grande que é secreta e invisível; é a realidade pequena que é evidente e enorme" (Chesterton, 2010, p. 79). Em outras palavras: enquanto se olhar para a enormidade dos números (que por verdadeiros que sejam são apenas deduções e não verdades), não se olhará para a pessoa, essa realidade "evidente e enorme", que não é aquilo que o Estado pensa dela... especialmente este Estado que se coloca acima do bem e do mal e que substitui a ontologia pelo moralismo... especialmente este Estado que, arrancando-nos o Ser e tudo que a Ele representa, arranca-nos a dignidade humana, arranca-nos a liberdade, arranca-nos o próprio ser, matando-nos aos poucos na medida em que nos imbeciliza e "mediocriza".

sábado, 26 de junho de 2010

Privado em nome da utilidade pública

Por Giorgio Vittadini*

Por que concepções tais como "mais sociedade, menos Estado" ou bem-estar subsidiário se tornaram atuais, como mostra o interessante debate que encontrou espaço nas páginas do Corriere? Um primeiro ponto sobre o qual devemos fixar nossa atenção é a necessidade de defender aquela tradição europeia que, a partir da centralidade da pessoa, "única e irrepetível", construiu um sistema de bem-estar universal voltado para a oferta de uma ampla gama de serviços públicos disponíveis para todos os cidadãos.
Mantendo a meta de não retroceder a partir desta importante conquista civil, e tendo presentes as novas exigências de um mundo em rápida mudança, torna-se necessário enfrentar as duas concepções de bem estar que, hoje, se contrapõem. Na Itália, há mais de dois séculos, prevaleceu a ideia de que um sistema de bem-estar universal só pudesse ser gerido por administrações e empresas públicas, através de uma forte programação do Estado central. Todavia, nas últimas décadas, por causa da crescente quantidade e qualidade das necessidades da população e por causa da explosão da dívida pública, tal concepção entrou em crise, levando muitos a acreditarem que, mesmo no bem-estar, devam valer as regras de um mercado "selvagem" guiado apenas pela lógica do proveito máximo. É evidente que se este sistema se afirmasse, as sociedades europeias assumiriam, em poucos anos, os aspectos mais deteriorados do mundo americano, com uma inaceitável e crescente contraposição entre ricos e pobres.
Contra esta contraposição estéril entre lógica pública e privada, chegou o momento de sublinhar o valor do chamado "bem-estar subsidiário", aquele no qual se encontra espaço para os serviços das realidades sem fim lucrativo, cujo melhor negócio consiste exatamente na busca de objetivos sociais. Os cidadãos, nestes casos, são titulares da liberdade de escolha a partir de dentro de uma pluralidade de oferta governada pelo Estado (através de mecanismos de credenciamento e avaliação que superem as assimetrias informativas) e financiada de forma a redistribuir as taxas (através de abonos, dotações, deduções e isenções fiscais, convenções etc.). Deste modo, se obteria a grande vantagem da liberdade de escolha dos usuários, típica dos mercados, e também a vantagem da garantia de serviços que respondam às necessidades elementares da população.
Um posterior valor agregado desta concepção é a recuperação de uma concepção de pessoa não isolada, mas em relação com outras pessoas e, enquanto tal, não apenas sujeito, mas sujeito do bem-estar. Desde a alta idade média, e depois por mérito do movimento católico, operário, e de uma concepção liberal e empresarial atenta às necessidades sociais, nasceram escolas, universidades, hospitais, obras assistenciais, intervenções de apoio ao trabalho, habitações populares, intervenções de proteção ambiental e artística, até mesmo institutos bancários. Ainda que não ajudadas por uma legislação que, pelo contrário, as discriminou, estas realidades de direito privado, mas públicas por objetivo, se encarregaram, de modo frequentemente mais eficaz e eficiente do que as estatais, das mais diversas necessidades sociais.
Este protagonismo social é o grande recurso a ser valorizado na atual fase de transição, como já entenderam, há bastante tempo, pensadores como Lester Salamon da Johns Hopkins (que fala da necessidade de parcerias público-privadas) ou Julian Le Grand da London School of Economics (que defende a livre escolha do usuário no bem-estar). Também a Corte constitucional italiana entendeu isso, há alguns anos atrás, quando definiu o escopo de utilidade pública das instituições e fundações bancárias. Mesmo a grande parte da população entendeu isso. E, finalmente, também entenderam algumas Regiões [no Brasil, essas "Regiões" equivaleriam, do ponto de vista administrativo, aos estados da federação; ndt] que reformaram suas legislações para permitir aos cidadãos a escolha, entre os prestadores de serviços de bem-estar, daqueles que mais respondiam às próprias necessidades. É chegado o momento de, também em nível nacional, colocar em ação uma reforma que recoloque no centro do sistema social a pessoa, não apenas como objeto mas também como sujeito do bem-estar. É chegado o momento de repensar as categorias de mérito e de paridade que, concebidas de maneira burocrática como são agora, arriscam obter o máximo da injustiça.

* Giorgio Vittadini é presidente da Fundação pela Subsidiariedade. Extraído do Corriere della Sera, do dia 26 de junho de 2010 (p. 56). Traduzido por Paulo R. A. Pacheco. 

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Um autor russo do século XX dizia...


do Testamento de Pável Aleksándrovich Florenski (1882-1937)

"Meus caríssimos filhinhos... acostumem-se, aprendam a fazer tudo o que vocês fazem com paixão, a ter gosto pela beleza, pela ordem; não se dispersem, não façam nada sem gosto, de qualquer maneira. Lembrem-se, no 'mais ou menos' é possível perder a vida toda e, pelo contrário, cumprindo de modo ordenado, harmonioso, até as coisas de importância secundária, é possível fazer muitas descobertas, que depois vão servir a vocês como fonte muito profunda de criatividade nova... E não apenas. Quem faz 'de qualquer jeito', aprende a falar do mesmo modo, e a palavra descuidada implica, depois, como consequência, num pensamento confuso. Meus queridos filhinhos, não permitam a vocês mesmos pensarem de modo descuidado. O pensamento é um dom de Deus, requer que cuidemos dele. Ser claros e responsáveis no próprio pensamento é o penhor da liberdade espiritual e da alegria do pensamento. Já faz muito tempo que eu queria lhes escrever isso: Observem as estrelas com mais frequência. Quando tiverem um peso na alma, olhem as estrelas ou o azul do céu. Quando se sentirem tristes, quando lhes ofenderem, quando alguma coisa não der certo ou se abater a tempestade interior, venham para fora e fiquem frente a frente com o céu. Então, a vossa alma encontrará sossego. Não fiquem tristes nem sofram por mim. Se vocês forem alegres e corajosos, eu também ficarei confortado. Sempre estarei com vocês na alma e, se o Senhor assim permitir, virei até vocês com frequência para velar por vocês. A coisa mais importante que lhes peço é que façam sempre memória do Senhor e caminhem na Sua presença. Com isso, lhes disse tudo o que eu era capaz de lhes dizer. O resto, nada mais é que particulares secundários. Mas, disso, nunca se esqueçam".

* Extraído do site da Revista Passos - Litterae Communionis.

quarta-feira, 1 de novembro de 2006

Mais sociedade faz bem para o Estado!

por Luigi Giussani

“Não consigo encontrar, como ser humano, uma outra razão para essa dignidade do homem, perante a qual tudo se deve curvar, ou em função da qual tudo se deve mover; até mesmo, e sobretudo, a vida em sociedade; do contrário, a afirmação do indivíduo e a afirmação da pessoa não passariam de uma violência voluntarista.
A estrutura social deve servir a essa estrutura humana (e não o contrário), na organicidade, embora trabalhosa, a ser imaginada e a ser preservada. Ora, de fato, constituindo a maior riqueza que o homem pode usar na existência, o poder tende a se interessar por aquilo que sustenta a si mesmo, tende a se automanter. Portanto, não se interessa tanto pelo homem, ou é tentado a não se interessar pelo homem, mas pelas suas reações, porque pode organizá-las num programa e suscitá-las conforme determinada linha.
Enfim, o poder tem a tentação de governar minuciosamente as reações do homem, e quanto mais se desenvolvem com habilidade os instrumentos de relação coletiva, mais essa possibilidade cresce. A estrutura social tende a admitir as exigências funcionais ao status quo, ou então a um projeto, a um programa, digamos, revolucionário, que derrube o status quo.
A insistência nos “valores comuns”, por exemplo, parece-me um jogo para rebaixar, uma tentativa de homologação que leve a obliterar e a cancelar as diferenças incômodas, e com isso, em última instância, as identidades reais. Assim, parece impossível que pertencer a um poder imanente a um determinado momento histórico não faça agir de modo potencialmente antitético ao valor originário da pessoa. É aqui que o poder se toma abuso de poder, a menos que ele seja continuamente contestado; é na vigilância e na colaboração para isso, a meu ver, que consiste a democracia verdadeira e viva.
O problema é análogo ao que ocorre na relação entre uma pessoa auto consciente e o seu Destino: se a pessoa não for continuamente provocada, a própria sujeição e a funcionalidade ao Destino serão impossíveis. É impossível a ela passar uma hora sem ser contradita da, sem se corromper seu caminho! Há como que uma força de gravidade sufocando todos os ímpetos, até os mais ideais;. enquanto estes se desenvolvem, aquela força já os dobra a uma posição oposta ao próprio ímpeto.
Portanto, somente parece-me possível o poder da sociedade não contradizer o ímpeto original da pessoa se, em coro, o poder for contestado, avaliado e acompanhado por formas de colaboração. Somente com a vigilância do povo o poder não se torna abuso de poder.
A democracia nasce como diálogo e colaboração entre entidades humanas que se estimam enquanto identidades precisas, e se respeitam não porque estabelecem limites entre si, mas pelo imperscrutável Destino da diferença, que é “caminho diferente para o destino comum”, como dizia Pascoli.
É nesse sentido que um espírito autenticamente religioso não pode deixar de ser autenticamente democrático. Mas sem esse olhar, ou sem essa perspectiva do Mistério inerente a toda presença, não sei se o homem é capaz de aceder àquela “veneração” pela qual é alimentada a estima, a própria mortificação na convivência, a capacidade de colaboração, a vigilância vivida em comum.
Interessa-me observar que, antes de mais nada, não podemos aceitar exclusivamente aquilo que consideramos possível, tolerável, legítimo. Resistir a essa sub-reptícia limitação não é fácil (digo”sub-reptícia”, pois acredito que normalmente se desenvolve, pelo menos nas origens, de forma inconsciente); mas resistir a essa sub-reptícia limitação que permite e aceita no outro somente aquilo que se considera possível, tolerável, legítimo significa, evidentemente, destruir uma fascinante diferença. É preciso conviver com a concepção antropológica e social que a pessoa tem.
Nesse sentido, há uma outra decorrência que é interessante salientar: creio que quem detém o poder não pode ter como objetivo deter todo o poder. Um pluralismo verdadeiro deve permitira expressão da pessoa também nas suas dimensões culturais e sociais, e, portanto, associativas: é uma terceira decorrência sugerida na Mater et magistra, de João XXIII, que inclui, entre os direitos fundamentais do homem, o direito à associação (MM, nn. 52-53; cf. PT, n. 11).
Isto me introduz no último pensamento que gostaria de lembrar: se a dignidade do homem vem daquele núcleo originário que não deriva de seu pai e de sua mãe, nem do conjunto dos antecedentes dos quais eles são função e instrumento; se a dignidade do homem consiste na relação com um quid último, quese condensa e se expressa - condensa-se metafisicamente e expressa-se existencialmente - em exigências e em desejos infinitos; se, portanto, uma convivência deve, antes de tudo, partir do respeito à identidade dos outros, essas exigências, esses desejos estimulam o homem a organizar estruturas que lhes sejam respostas. Essas exigências e esses desejos, com efeito, tanto mais estimularão o homem quanto mais intensa for a consciência da exigência do desejo, e levá-lo-ão a construir uma obra, como tentativa de realizar uma estrutura que facilite e torne estável a resposta às suas exigências. Para o homem, é impossível não procurar algumas afinidades, não buscar uma companhia, e é nesse sentido que o valor associativo se torna também eminentemente operativo.
O ponto fundamental para julgar o relacionamento entre pessoa (ou liberdade) e poder (sociedade e poder) é exatamente este: que a sociedade seja guiada de tal modo que a força do poder, antes de tudo, seja utilizada para facilitar, valorizar, intensificar a obra – uma ou várias – que tende a originar-se do indivíduo, sobretudo do indivíduo associado.
Por isso, sempre insisti na fórmula segundo a qual um verdadeiro governo do povo, de uma sociedade humanamente viva, deve, acima de tudo, favorecer a criatividade da base, só intervindo (conforme o conclamado “princípio de subsidiariedade” da Doutrina Social da Igreja) para realizar, sustentar e, eventualmente, criar aquilo que ainda não foi pensado na atividade dos homens conscientes e vivos. “Mais sociedade, menos Estado!” não significa de modo algum encobrir o valor do Estado, mas simplesmente mostrar ao Estado o horizonte último da sua atividade: ajudar o homem, cada homem, a caminhar rumo ao seu Destino, com toda a produtividade e, por isso, com a utilidade, em todos os sentidos, de que a Natureza o tornou capaz”.

* Trecho de O eu, o poder, as obras, de Luigi Giussani.