sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Querem eliminar o Big Bang, mas não nos explicam aquilo que vemos

Por Mario Gargantini
(Entrevista com Marco Bersanelli)

De vez em quando, alguém nos prova. A ideia de poder abater as teorias dominantes é muito estimulante para os cientistas e, sobretudo, para os físicos teóricos. Imagine-se quando se trata de teorias que dizem respeito ao universo inteiro, à sua origem e à sua evolução

Agora é a vez do físico chinês Wun-Yi Shu, do Departamento de Estatística da National Tsing Hua University de Taiwan, que publicou no site arXiv.org, o serviço de publicações on line da Cornell University, um artigo com um título peremptório: “Cosmological Models with No Big Bang”, ou seja, Modelos cosmológicos sem Big Bang.
Wun-Yi Shu se diferencia de outros opositores do Big Bang, como o astrofísico americano Halton Arp, célebre pelas suas interpretações alternativas do deslocamento em direção ao vermelho (red shift) do espectro das galáxias. Arp tinha chegado a negado a mesma expansão do universo, vendo o red shift como puro indicador da idade das galáxias e dos quasar e desenvolvendo uma cosmologia que não precisa da grande explosão inicial. Mas os dados experimentais fizeram essa hipótese se esconder.
O físico taiwanês não considera os trabalhos de Arp (que não é nem mesmo citado na bibliografia do artigo), mas constrói a sua argumentação exatamente a partir dos grandes resultados observacionais do final dos anos 1990, quando se pôde medir a taxa de expansão do universo e se descobriu não apenas que a expansão está em andamento, mas também que está se acelerando.
Para explicar um fenômeno semelhante os físicos tiveram que recorrer à hipótese da existência de uma “energia escura”, que constituiria mesmo 73% do universo e cuja natureza permanece ainda “escura”. Abriu-se, então, a temporada de caça a essa energia e a sua descoberta é um dos objetivos de muitas pesquisas não apenas em cosmologia, mas também na física fundamental (LHC [Large Hadron Collider – Grande Colisor de Hádrons; ndt] não poderá dizer nada sobre a Dark Energy [Energia Escura; ndt], apenas sobre a Dark Matter [Matéria Escura; ndt]!).
Pois bem, Wun-Yi Shu não quer ouvir falar de energia escura e recomeça a partir das clássicas equações do campo gravitacional de Einstein sem, porém, introduzir a chamada constante cosmológica; assume, além do mais, a hipótese de que a velocidade da luz e a constante de gravitação universal de Newton não são constantes mas mudam de valor com a expansão. Esta última, portanto, seria variável, alternando fases de aceleração e de desaceleração. Consequentemente, não existiria nenhuma explosão inicial e nenhum estágio final, enquanto tempo e espaço continuariam a se converter um no outro.
Mas, como os cientistas que estãao estudando o universo exatamente em seus instantes iniciais – perto do Big Bang – reagiram a essa visão? Segundo Marco Bersanelli, astrofísico da Università degli Studi de Milão, “trata-se de uma nova versão de uma velha ideia, que remonta a Paul Dirac, nos idos de 1930, acerca da variação das constantes de natureza com o tempo cósmico: particularmente da velocidade da luz e da constante de gravidade. Esta versão, que eliminaria do ponto de vista dinâmico a necessidade de uma fase inicial quente do universo, está porém particularmente em dificuldade, em face dos numerosos dados que provêm das observações cosmológicas e astrofísicas”. 
Bersanelli indica, portanto, a série de desencontros derivados das observações, que nos últimos tempos se tornaram sempre mais potentes e precisas. “É, de fato, consolidada a observação da abundância dos elementos leves primordiais (hélio e deutério em particular) de pleno acordo com as previsões de uma fase primordial quente do universo, quando nos primeiros minutos depois do Big Bang a temperatura devia ser em qualquer lugar equivalente àquela que hoje se encontra no centro das estrelas”.
Em seguida, faz referência às medidas que ele mesmo está elaborando a partir dos dados recolhidos pela sonda espacial Planck, a missão da ESA [European Space Agency – Agência Espacial Europeia; ndt] que está em curso nesse momento e da qual o físico milanês é um dos líderes: “São ainda mais contundentes, do ponto de vista da observação, as características e a existência mesma do fundo cósmico de microondas, a luz primordial deixada no universo há 14 milhões de anos atrás. Hoje, podemos mensurar com grande precisão as propriedades finas dessa luz fóssil (espectro, anisotropia e polarização), que foram previstas antes da sua observação, exatamente hipotetizando a existência da fase inicial quente do universo”. É com esses dados que cada nova teoria tem que lidar, sem chegar a conclusões precipitdas sobre os efeitos. 
Bersanelli além do mais não está unilateralmente emparedado na defesa da teoria do Big Bang e está aberto a avaliar outros possíveis modelos; na condição de que esses modelos venham acompanhados de dados e de medidas e consigam explicar os fenômenos observados: “Seria interessante se hoje existisse uma teoria cosmológica credível alternativa àquela do Big Bang quente. Todavia, até que os cenários propostos nao sejam capazes de dar as razões dessas observações fundamentais e bem consolidadas não poderão ser cientificamente competitivas”.
Um decisivo chamado de atenção, portanto, a um critério fundamental que guia a explicação científica dos fenômenos naturais, ou seja, a exigência de fazer passar cada hipótese e modelo explicativo pelo severo tribunal da observação e pelo crivo do suporte experimental. Mantendo bem firme a convicção de que a ciência tem muito a nos dizer sobre como este mundo existe, mas nada pode afirmar sobre a pergunta mais crucial do porquê existe, sobre o mistério da sua existência mesma.

* Extraído do IlSussidiario.net, do dia 13 de agosto de 2010. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

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