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segunda-feira, 30 de maio de 2011

E houve grande alegria...

Bento XVI

Regina Coeli

Praça São Pedro
Domingo, 29 de maio de 2011.

Caros irmãos e irmãs!
O livro dos Atos dos Apóstolos diz que, depois de uma primeira perseguição violenta, a comunidade cristã de Jerusalém, excetuados os apóstolos, se dispersou nas regiões vizinhas e Felipe, um dos diáconos, chegou a uma cidade da Samaria. Ali, pregou Cristo ressuscitado, e o seu anúncio foi acompanhado de numerosas curas, de forma que a conclusão do episódio é muito significativa: “E houve grande alegria naquela cidade” (At 8, 8). A cada vez, ficamos tocados por esta expressão que, na sua essencialidade, nos comunica um senso de esperança; como se dissesse: é possível! É possível que a humanidade conheça a verdadeira alegria, porque aonde chega o Evangelho floresce a vida; como um terreno árido que, irrigado pela chuva, de repete se torna verde outra vez. Felipe e os outros discípulos, com a força do Espírito Santo, fizeram nos vilarejos da Palestina aquilo que Jesus havia feito: pregaram a Boa Nova e operaram sinais prodigiosos. Era o Senhor que agia por meio deles. Como Jesus anunciava a vinda do Reino de Deus, assim os discípulos anunciaram Jesus ressuscitado, professando que Ele é o Cristo, o Filho de Deus, batizando no seu nome e expulsando toda doença do corpo e do espírito.
“E houve grande alegria naquela cidade.” Lendo este trecho, é espontâneo que se pense na força curadora do Evangelho, que no curso dos séculos “irrigou”, como rio benéfico, tantas populações. Alguns grandes santos e santas levaram esperança e paz a cidades inteiras – pensemos em São Carlos Borromeu em Milão, no tempo da peste; na beata Madre Teresa em Calcutá; e em tantos missionários, cujos nomes são conhecidos por Deus, que deram a vida para levar o anúncio de Cristo e fazer florescer entre os homens a alegria profunda. Enquanto que os poderosos deste mundo buscavam conquistar novos territórios por interesses políticos e econômicos, os mensageiros de Cristo iam a todos os lugares com o objetivo de levar Cristo aos homens e os homens a Cristo, sabendo que somente Ele pode dar a verdadeira liberdade e a vida eterna. Ainda hoje a vocação da Igreja é a evangelização: seja das populações que não foram ainda “irrigadas” pela água viva do Evangelho, seja daquelas que, mesmo tendo antigas raízes cristãs, têm necessidade de nova seiva para fazer brotar novos frutos, e redescobrir a beleza e a alegria da fé.
Caros amigos, o Beato João Paulo II foi um grande missionário, como está documentado pela mostra que, durante esses dias, está montada em Roma. Ele lançou a missão ad gentes outra vez e, ao mesmo tempo, promoveu a nova evangelização. Confiemos uma e outra à intercessão de Maria Santíssima. A Mãe de Cristo acompanhe sempre e em todos os lugares o anúncio do Evangelho, para que se multipliquem e se alarguem no mundo os espaços nos quais os homens reencontrem a alegria de viver como filhos de Deus.

* Extraído do site do Vaticano, do dia 29 de maio de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Comentário ao evangelho do dia

5ª-feira da 2ª Semana Quaresma

1ª Leitura - Jr 17,5-10
Isto diz o Senhor: "Maldito o homem que confia no homem e faz consistir sua força na carne humana, enquanto o seu coração se afasta do Senhor; como os cardos no deserto, ele não vê chegar a floração, prefere vegetar na secura do ermo, em região salobra e desabitada. Bendito o homem que confia no Senhor, cuja esperança é o Senhor; é como a árvore plantada junto às águas, que estende as raízes em busca de umidade, por isso não teme a chegada do calor: sua folhagem mantém-se verde, não sofre míngua em tempo de seca e nunca deixa de dar frutos. Em tudo é enganador o coração, e isto é incurável; quem poderá conhecê-lo? Eu sou o Senhor, que perscruto o coração e provo os sentimentos, que dou a cada qual conforme o seu proceder e conforme o fruto de suas obras".

Evangelho - Lc 16,19-31
Naquele tempo, Jesus disse aos fariseus: "Havia um homem rico, que se vestia com roupas finas e elegantes e fazia festas esplêndidas todos os dias. Um pobre, chamado Lázaro, cheio de feridas, estava no chão à porta do rico. Ele queria matar a fome com as sobras que caíam da mesa do rico. E, além disso, vinham os cachorros lamber suas feridas. Quando o pobre morreu, os anjos levaram-no para junto de Abraão. Morreu também o rico e foi enterrado. Na região dos mortos, no meio dos tormentos, o rico levantou os olhos e viu de longe a Abraão, com Lázaro ao seu lado. Então gritou: 'Pai Abraão, tem piedade de mim! Manda Lázaro molhar a ponta do dedo para me refrescar a língua, porque sofro muito nestas chamas'. Mas Abraão respondeu: 'Filho, lembra-te que tu recebeste teus bens durante a vida e Lázaro, por sua vez, os males. Agora, porém, ele encontra aqui consolo e tu és atormentado. E, além disso, há um grande abismo entre nós: por mais que alguém desejasse, não poderia passar daqui para junto de vós, e nem os daí poderiam atravessar até nós'. O rico insistiu: 'Pai, eu te suplico, manda Lázaro à casa do meu pai, porque eu tenho cinco irmãos. Manda preveni-los, para que não venham também eles para este lugar de tormento'. Mas Abraão respondeu: 'Eles têm Moisés e os Profetas, que os escutem!'. O rico insistiu: 'Não, Pai Abraão, mas se um dos mortos for até eles, certamente vão se converter'. Mas Abraão lhe disse: 'Se não escutam a Moisés, nem aos Profetas, eles não acreditarão, mesmo que alguém ressuscite dos mortos'".

Comentário feito por Beata Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Cristo disse: "Tive fome e Me destes de comer" (Mt 25, 35). Teve fome não só de pão, mas também da estima acolhedora que nos permite sentirmo-nos amados, reconhecidos, sermos alguém aos olhos de outrem. Foi desprovido não só da Sua roupa, mas também da dignidade e do respeito humano pela grande injustiça cometida para com o pobre, que é precisamente o ser desprezado por ser pobre. Foi privado não só de um teto, mas também sofreu as privações por que passam os encarcerados, os rejeitados e os escorraçados, aqueles que vagueiam pelo mundo sem ter ninguém que se ocupe deles. Ao desceres a rua, sem outro propósito senão esse, talvez atentes naquele homem, ali na esquina, e vás ao seu encontro. Talvez ele fique de pé atrás, mas tu permaneces lá, diante dele, na sua frente. Tens de irradiar a presença que trazes dentro de ti com o amor e a atenção para com o homem a quem te diriges. E por quê? Porque, para ti, se trata de Jesus. Sim, é Jesus, mas não pode receber-te em Sua casa — eis porque tens de ser tu a dirigir-te a Ele. Ele está escondido ali, naquela pessoa. Jesus, oculto no mais pequenino dos irmãos (Mt 25, 40), não só cheio de fome por um bocado de pão, mas também por amor, por reconhecimento, por ser tido como alguém com valor. 

terça-feira, 15 de março de 2011

Comentário ao evangelho do dia

3ª-feira da 1ª Semana Quaresma

1ª Leitura - Is 55,10-11
Isto diz o Senhor: "assim como a chuva e a neve descem do céu e para lá não voltam mais, mas vêm irrigar e fecundar a terra, e fazê-la germinar e dar semente, para o plantio e para a alimentação, assim a palavra que sair de minha boca: não voltará para mim vazia; antes, realizará tudo que for de minha vontade e produzirá os efeitos que pretendi, ao enviá-la".

Evangelho - Mt 6,7-15
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Quando orardes, não useis muitas palavras, como fazem os pagãos. Eles pensam que serão ouvidos por força das muitas palavras. Não sejais como eles, pois vosso Pai sabe do que precisais, muito antes que vós o peçais. Vós deveis rezar assim: Pai Nosso que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu Reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como nos céus. O pão nosso de cada dia dá-nos hoje. Perdoa as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. De fato, se vós perdoardes aos homens as faltas que eles cometeram, vosso Pai que está nos céus também vos perdoará. Mas, se vós não perdoardes aos homens, vosso Pai também não perdoará as faltas que vós cometestes.

Comentário feito por Beata Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Só há uma voz que se eleva à face da terra: a voz de Cristo. Esta voz reúne e coordena, em Si mesma, todas as vozes que se elevam em oração. Rezar: muitas pessoas não sabem como fazer. Muitas não ousam fazê-lo e muitas não o querem fazer. Na comunhão dos santos, nós agimos e rezamos por elas. Rezamos em nome daqueles que não rezam. A oração deveria tornar-se a nossa "profissão". Os Apóstolos compreenderam-no na perfeição: quando se aperceberam de que se arriscavam a perder-se na multiplicidade de atividades, decidiram dedicar-se à oração contínua e ao ministério da Palavra (At 6, 4). [...] [Deus] permite que falhemos, mas não quer o desânimo. Quer que sejamos cada vez mais como crianças, mais humildes, mais reconhecidos na oração e que não tentemos rezar sós, pois todos pertencemos ao Corpo místico de Cristo, que está sempre em oração. Não se trata de "eu rezo" mas de, em mim e comigo, Jesus rezar e, assim, é o Corpo de Cristo que reza. 

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Comentário ao evangelho do dia

1ª Leitura - Is 58,7-10
Assim diz o Senhor: "Reparte o pão com o faminto, acolhe em casa os pobres e peregrinos. Quando encontrares um nu, cobre-o, e não desprezes a tua carne. Então, brilhará tua luz como a aurora e tua saúde há de recuperar-se mais depressa; à frente caminhará tua justiça e a glória do Senhor te seguirá. Então invocarás o Senhor e ele te atenderá, pedirás socorro, e ele dirá: 'Eis-me aqui'. Se destruíres teus instrumentos de opressão, e deixares os hábitos autoritários e a linguagem maldosa; se acolheres de coração aberto o indigente e prestares todo o socorro ao necessitado, nascerá nas trevas a tua luz e tua vida obscura será como o meio-dia".

2ª Leitura - 1Cor 2,1-5
Irmãos, quando fui à vossa cidade anunciar-vos o mistério de Deus, não recorri a uma linguagem elevada ou ao prestígio da sabedoria humana. Pois, entre vós, não julguei saber coisa alguma, a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado. Aliás, eu estive junto de vós, com fraqueza e receio, e muito tremor. Também a minha palavra e a minha pregação não tinham nada dos discursos persuasivos da sabedoria, mas eram uma demonstração do poder do Espírito, para que a vossa fé se baseasse no poder de Deus e não na sabedoria dos homens.

Evangelho - Mt 5,13-16
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insosso, com que salgaremos? Ele não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um monte. Ninguém acende uma lâmpada, e a coloca debaixo de uma vasilha, mas sim, num candeeiro, onde brilha para todos que estão na casa. Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus. 

Comentário feito por Beata Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Os cristãos são para os outros (para os homens do mundo inteiro) como a luz. Se somos cristãos, devemos ser parecidos com Cristo. Se quereis aprender a ser assim, a arte da atenção far-vos-á  ser cada vez mais como Cristo, que tinha o coração humilde e estava sempre atento às necessidades dos homens. Nesta atenção para com os outros dá-se início a uma grande santidade, e, para ser bela, a nossa vocação deve estar cheia dessa atenção. Por onde Jesus passou, só fez o bem. E em Caná a Virgem Maria só pensou nas necessidades dos outros e no modo de o dizer a Jesus. O cristão é um tabernáculo do Deus vivo. Ele me criou, escolheu-me e veio morar em mim porque de mim teve necessidade. E, agora que já aprenderam quanto Deus vos ama, o que haverá de mais natural do que passar o resto da vossa vida a resplandecer com esse amor? Ser verdadeiramente cristão é acolher Cristo de verdade e assim vir a ser outro Cristo; é amar como somos amados, como Cristo nos amou na Cruz.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

São João Bosco

Evangelho - Mc 5,1-20
Naquele tempo, Jesus e seus discípulos chegaram à outra margem do mar, na região dos gerasenos. Logo que saiu da barca, um homem possuído por um espírito impuro, saindo de um cemitério, foi ao seu encontro. Esse homem morava no meio dos túmulos e ninguém conseguia amarrá-lo, nem mesmo com correntes. Muitas vezes tinha sido amarrado com algemas e correntes, mas ele arrebentava as correntes e quebrava as algemas. E ninguém era capaz de dominá-lo. Dia e noite ele vagava entre os túmulos e pelos montes, gritando e ferindo-se com pedras. Vendo Jesus de longe, o endemoninhado correu, caiu de joelhos diante dele e gritou bem alto: "Que tens a ver comigo, Jesus, Filho do Deus altíssimo? Eu te conjuro por Deus, não me atormentes!". Com efeito, Jesus lhe dizia: "Espírito impuro, sai desse homem!". Então Jesus perguntou: "Qual é o teu nome?". O homem respondeu: "Meu nome é 'Legião', porque somos muitos". E pedia com insistência para que Jesus não o expulsasse da região. Havia aí perto uma grande manada de porcos, pastando na montanha. O espírito impuro suplicou, então: "Manda-nos para os porcos, para que entremos neles". Jesus permitiu. Os espíritos impuros saíram do homem e entraram nos porcos. E toda a manada - mais ou menos uns dois mil porcos - atirou-se monte abaixo para dentro do mar, onde se afogou. Os homens que guardavam os porcos saíram correndo e espalharam a notícia na cidade e nos campos. E as pessoas foram ver o que havia acontecido. Elas foram até Jesus e viram o endemoninhado sentado, vestido e no seu perfeito juízo, aquele mesmo que antes estava possuído pela Legião. E ficaram com medo. Os que tinham presenciado o fato explicaram-lhes o que havia acontecido com o endemoninhado e com os porcos. Então começaram a pedir que Jesus fosse embora da região deles. Enquanto Jesus entrava de novo na barca, o homem que tinha sido endemoninhado pediu-lhe que o deixasse ficar com ele. Jesus, porém, não permitiu. Entretanto, lhe disse: "Vai para casa, para junto dos teus e anuncia-lhes tudo o que o Senhor, em sua misericórdia, fez por ti". Então o homem foi embora e começou a pregar na Decápole tudo o que Jesus tinha feito por ele. E todos ficavam admirados.

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

"O homem que fora possesso suplicou-Lhe que o deixasse andar com Ele. [...] Disse-lhe antes: 'Vai para tua casa, para junto dos teus, e conta-lhes tudo o que o Senhor fez por ti'". Somos chamados a amar o mundo. E Deus amou de tal forma o mundo que lhe deu Jesus (Jo 3, 16). Hoje, Ele ama de tal forma o mundo que nos dá ao mundo, a ti e a mim, para que sejamos o Seu amor, a Sua compaixão e a Sua presença através de uma vida de oração, de sacrifícios e de entrega. A resposta que Deus espera de ti é que te tornes contemplativo, que sejas contemplativo. Tomemos a palavra de Jesus a sério e sejamos contemplativos no coração do mundo porque, se temos fé, estamos perpetuamente na Sua presença. Pela contemplação a alma bebe diretamente do coração de Deus as graças que a vida ativa está encarregada de distribuir. As nossas vidas devem estar unidas a Cristo vivo que está em nós. Se não vivermos na presença de Deus, não podemos perseverar. O que é a contemplação? É viver a vida de Jesus. É assim que a compreendo. Amar Jesus, viver a Sua vida no âmago da nossa e viver a nossa no seio da Sua. [...] A contemplação não ocorre por nos fecharmos num quarto escuro, mas por permitirmos a Jesus que viva a Sua Paixão, o Seu amor, a Sua humildade em nós, que reze conosco, que esteja conosco e que santifique através de nós. A nossa vida e a nossa contemplação são unas. Não é uma questão de fazer, mas de ser. De fato, trata-se da plena fruição do nosso espírito pelo Espírito Santo, que derrama em nós a plenitude de Deus e nos envia a toda a Criação como mensagem Sua, pessoal, de amor (Mc 16, 15). 

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Não basta uma proclamação abstrata da liberdade religiosa...

Discurso do Papa Bento XVI
ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé
para a troca de bons votos de início de ano

Sala Régia
Segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Excelências,
Senhoras e Senhores,
Com alegria, dou-vos as boas vindas a este encontro que, cada ano, vos reúne ao redor do Sucessor de Pedro a vós, ilustres Representantes de tão grande número de países. Este encontro reveste-se de alto significado, porque oferece uma imagem e, simultaneamente, um exemplo do papel da Igreja e da Santa Sé na comunidade internacional. A cada um de vós dirijo as minhas saudações e votos cordiais, em particular a quantos estão aqui pela primeira vez. Agradeço-vos pelo empenho e atenção com que, no exercício das vossas delicadas funções, seguis as minhas atividades, as da Cúria Romana e, assim de certa maneira, a vida da Igreja Católica em todo o mundo. O vosso Decano, Embaixador Alejandro Valladares Lanza, fez-se intérprete dos vossos sentimentos, e agradeço-lhe os votos que me exprimiu em nome de todos. Sabendo como é unida a vossa comunidade, tenho a certeza que hoje, no vosso pensamento, tendes presente a Embaixadora do Reino da Holanda, Baronesa van Lynden-Leijten, que regressou à casa do Pai há algumas semanas. Na oração, associo-me aos vossos sentimentos.
Quando começa um novo ano, ainda ressoa nos nossos corações e no mundo inteiro o eco daquele anúncio jubiloso que se manifestou, há vinte séculos, na noite de Belém, noite que simboliza a condição da humanidade em sua carência de luz, de amor e de paz. Aos homens de então como aos de hoje, os mensageiros celestes trouxeram a boa nova da chegada do Salvador: "O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para os que habitavam na terra da escuridão, uma luz começou a brilhar" (Is 9, 1). O mistério do Filho de Deus que Se torna Filho do homem supera seguramente toda a expectativa humana. Na sua gratuidade absoluta, este acontecimento de salvação é a resposta autêntica e completa ao desejo profundo do coração. A verdade, o bem, a felicidade, a vida em plenitude que cada homem busca, consciente ou inconscientemente, são-lhe concedidos por Deus. Cada pessoa, ao anelar por estes benefícios, está à procura do seu Criador, porque "só Deus responde à sede que está no coração de cada homem" (Exort. ap. pós-sinodal Verbum Domini, 23). A humanidade, em toda a sua história, através das suas crenças e dos seus ritos, manifesta uma busca incessante de Deus e "estas formas de expressão são tão universais que bem podemos chamar ao homem um ser religioso" (Catecismo da Igreja Católica, 28). A dimensão religiosa é uma característica inegável e irrefreável do ser e do agir do homem, a medida da realização do seu destino e da construção da comunidade a que pertence. Por isso, quando o próprio indivíduo ou aqueles que o rodeiam negligenciam ou negam este aspecto fundamental, geram-se desequilíbrios e conflitos em todos os níveis, tanto no plano pessoal como no interpessoal.
Nesta verdade primária e basilar, encontra-se a razão por que indiquei a liberdade religiosa como o caminho fundamental para a construção da paz, na Mensagem para a Celebração da Jornada Mundial da Paz deste ano. De fato, a paz constrói-se e conserva-se apenas na medida em que o homem possa livremente procurar e servir a Deus no seu coração, na sua vida e nas suas relações com os outros.  
Senhoras e Senhores Embaixadores, a vossa presença nesta circunstância solene é um convite a fazer uma viagem panorâmica sobre todos os países que representais e sobre o mundo inteiro. Não há porventura, neste panorama, numerosas situações onde, infelizmente, o direito à liberdade religiosa é lesado ou negado? Este direito do homem – que, na realidade, é o primeiro dos direitos, porque historicamente se afirmou em primeiro lugar e ainda porque tem como objeto a dimensão constitutiva do homem, isto é, a sua relação com o Criador – não é demasiadas vezes posto em discussão ou violado? Parece-me que a sociedade, os seus responsáveis e a opinião pública hoje se dão conta em medida maior, embora nem sempre de maneira exata, desta grave ferida infligida à dignidade e à liberdade do homo religiosus, para a qual já várias vezes senti necessidade de chamar a atenção de todos.
Fi-lo durante as minhas viagens apostólicas do ano passado a Malta e a Portugal, a Chipre, à Grã-Bretanha e à Espanha. Independentemente das características destes países, de todos conservo uma recordação cheia de gratidão pelo acolhimento que me reservaram. A Assembleia Especial para o Oriente Médio do Sínodo dos Bispos, que decorreu no Vaticano durante o mês de Outubro, foi um período de oração e de reflexão, durante o qual o pensamento se dirigiu, insistentemente, para as comunidades cristãs daquela região do mundo, tão provadas por causa da sua adesão a Cristo e à Igreja.
Sim, olhando para o Oriente, os atentados que semearam morte, sofrimento e desconcerto entre os cristãos do Iraque, a ponto de os impelir a deixar a terra onde seus pais viveram ao longo dos séculos, contristaram-nos profundamente. Renovo às autoridades deste país e aos chefes religiosos muçulmanos o meu ansioso apelo a trabalharem para que os seus concidadãos cristãos possam viver em segurança e continuar a prestar a sua contribuição à sociedade de que são membros com pleno título. Também no Egito, em Alexandria, o terrorismo feriu brutalmente fiéis em oração numa igreja. Esta sucessão de ataques é mais um sinal da urgente necessidade que há de os governos da região adotarem, não obstante as dificuldades e as ameaças, medidas eficazes para a proteção das minorias religiosas. Será preciso dizê-lo uma vez mais? No Oriente Médio, "os cristãos são cidadãos originários e autênticos, leais à sua pátria e fiéis a todos os seus deveres nacionais. É natural que possam gozar de todos os direitos de cidadania, de liberdade de consciência e de culto, de liberdade no campo do ensino e da educação e no uso dos meios de comunicação" (Mensagem ao Povo de Deus da Assembleia Especial para o Oriente Médio do Sínodo dos Bispos, 10). A este respeito, aprecio a atenção pelos direitos dos mais débeis e a clarividência política de que deram prova alguns países da Europa nos últimos dias, pedindo uma resposta concertada da União Europeia a fim de que os cristãos sejam defendidos no Oriente Médio. Quero, enfim, recordar que a liberdade religiosa não é plenamente aplicada quando se garante apenas a liberdade de culto, com limitações. Além disso, encorajo a acompanhar a plena tutela da liberdade religiosa e dos outros direitos humanos com programas que, desde a escola primária e no quadro do ensino religioso, eduquem para o respeito de todos os irmãos em humanidade. Além disso, pelo que diz respeito aos Estados da Península Arábica, onde vivem numerosos trabalhadores emigrantes cristãos, espero que a Igreja Católica possa dispor de adequadas estruturas pastorais.
Entre as normas que lesam o direito das pessoas à liberdade religiosa, uma menção particular deve ser feita da lei contra a blasfêmia no Paquistão: de novo encorajo as autoridades deste país a realizarem os esforços necessários para a ab-rogar, tanto mais que é evidente que a mesma serve de pretexto para provocar injustiças e violências contra as minorias religiosas. O trágico assassinato do Governador do Punjab mostra como é urgente caminhar neste sentido: a veneração a Deus promove a fraternidade e o amor, não o ódio nem a divisão. Outras situações preocupantes, por vezes com atos de violência, podem ser mencionadas no Sul e Sudeste do continente asiático, em países que aliás têm uma tradição de relações sociais pacíficas. O peso particular de uma determinada religião numa nação não deveria jamais implicar que os cidadãos pertencentes a outra confissão fossem discriminados na vida social ou, pior ainda, que se tolerasse a violência contra eles. A este respeito, é importante que o diálogo inter-religioso favoreça um compromisso comum por reconhecer e promover a liberdade religiosa de cada pessoa e de cada comunidade. Enfim, como já recordei, a violência contra os cristãos não poupa a África. Os ataques contra lugares de culto na Nigéria, precisamente enquanto se celebrava o Natal de Cristo, são outro triste testemunho disso mesmo.
Por outro lado, em diversos países, a Constituição reconhece uma certa liberdade religiosa, mas, de fato, a vida das comunidade religiosas torna-se difícil e por vezes até precária (cf. Conc. Vat. II, Decl. Dignitatis humanae, 15), porque o ordenamento jurídico ou social se inspira em sistemas filosóficos e políticos que postulam um estrito controle – para não dizer um monopólio – do Estado sobre a sociedade. É preciso que cessem tais ambiguidades, de maneira que os crentes não se vejam lacerados entre a fidelidade a Deus e a lealdade à sua pátria. De modo particular, peço que seja por todo o lado garantida às comunidades católicas a plena autonomia de organização e a liberdade de cumprir a sua missão, de acordo com as normas e padrões internacionais neste campo.
Neste momento, o meu pensamento volta-se de novo para a comunidade católica da China continental e os seus Pastores, que vivem um período de dificuldade e provação. Mudando de latitude, quero dirigir uma palavra de encorajamento às autoridades de Cuba – país que celebrou, em 2010, setenta e cinco anos de ininterruptas relações diplomáticas com a Santa Sé – para que o diálogo, que felizmente se instaurou com a Igreja, se reforce e amplie ainda mais.
Voltando o nosso olhar para o Ocidente, deparamos com outros tipos de ameaça contra o pleno exercício da liberdade religiosa. Penso, em primeiro lugar, em países onde se reconhece uma grande importância ao pluralismo e à tolerância, enquanto a religião sofre uma crescente marginalização. Tende-se a considerar a religião, toda a religião, como um fator sem importância, alheio à sociedade moderna ou mesmo desestabilizador e procura-se, com diversos meios, impedir toda e qualquer influência dela na vida social. Deste modo, chega-se a pretender que os cristãos ajam, no exercício da sua profissão, sem referimento às suas convicções religiosas e morais, e mesmo em contradição com elas, como, por exemplo, quando estão em vigor leis que limitam o direito à objeção de consciência dos profissionais da saúde ou de certos operadores do direito.
Neste contexto, não é possível deixar de alegrar-se com a adoção pelo Conselho da Europa, no passado mês de outubro, de uma Resolução que protege o direito do pessoal médico à objeção de consciência face a certos atos que lesam gravemente o direito à vida, como o aborto. 
Outra manifestação da marginalização da religião, e particularmente do cristianismo, consiste em banir da vida pública festas e símbolos religiosos, em nome do respeito por quantos pertencem a outras religiões ou por aqueles que não acreditam. Agindo deste modo, não apenas se limita o direito dos crentes à expressão pública da sua fé, mas cortam-se também raízes culturais que alimentam a identidade profunda e a coesão social de numerosas nações. No ano passado, alguns países europeus associaram-se ao recurso apresentado pelo governo italiano na causa, bem conhecida, da exposição do crucifixo nos lugares públicos. Desejo exprimir a minha gratidão às autoridade destas nações e a quantos se empenharam neste sentido, episcopados, organizações e associações civis ou religiosas, particularmente ao Patriarcado de Moscou e demais representantes da hierarquia ortodoxa, bem como a todas as pessoas – crentes, mas também não crentes – que sentiram necessidade de manifestar a sua adesão a este símbolo grávido de valores universais.
Reconhecer a liberdade religiosa significa, além disso, garantir que as comunidades religiosas possam agir livremente na sociedade, com iniciativas nos setores social, caritativo ou educativo. Pode-se constatar por todo o lado, no mundo, a fecundidade das obras da Igreja Católica nestes âmbitos. Causa preocupação ver este serviço que as comunidades religiosas prestam a toda a sociedade, particularmente em favor da educação das jovens gerações, comprometido ou dificultado por projetos de lei que correm o risco de criar uma espécie de monopólio estatal em matéria escolástica, como se constata, por exemplo, em certos países da América Latina. Quando vários deles celebram o segundo centenário da sua independência, ocasião propícia para se recordar a contribuição da Igreja Católica para a formação da identidade nacional, exorto todos os governos a promoverem sistemas educativos que respeitem o direito primordial das famílias de decidir sobre a educação dos filhos e que se inspirem no princípio de subsidiariedade, fundamental para organizar uma sociedade justa.
Continuando a minha reflexão, não posso passar sem referir outra ameaça à liberdade religiosa das famílias em alguns países europeus, onde é imposta a participação em cursos de educação sexual ou cívica que propagam concepções da pessoa e da vida pretensamente neutras mas que, na realidade, refletem uma antropologia contrária à fé e à reta razão.
Senhoras e Senhores Embaixadores, nesta circunstância solene, permiti-me explicitar alguns princípios que inspiram a Santa Sé, com toda a Igreja Católica, na sua atividade junto das Organizações Internacionais intergovernamentais, a fim de promover o pleno respeito da liberdade religiosa para todos. Em primeiro lugar, aparece a convicção de que não se pode criar uma espécie de escala na gravidade da intolerância com as religiões. Infelizmente, é frequente uma tal atitude, sendo precisamente os atos discriminatórios contra os cristãos aqueles que se consideram menos graves, menos dignos de atenção por parte dos governos e da opinião pública. Ao mesmo tempo, há que rejeitar também o contraste perigoso que alguns querem instaurar entre o direito à liberdade religiosa e os outros direitos do homem, esquecendo ou negando assim o papel central do respeito da liberdade religiosa na defesa e proteção da alta dignidade do homem. Menos justificáveis ainda são as tentativas de contrapor ao direito da liberdade religiosa pretensos novos direitos, promovidos ativamente por certos setores da sociedade e inseridos nas legislações nacionais ou nas diretrizes internacionais, mas que, na realidade, são apenas a expressão de desejos egoístas e não encontram o seu fundamento na natureza humana autêntica. Enfim, é preciso afirmar que não basta uma proclamação abstrata da liberdade religiosa: esta norma fundamental da vida social deve encontrar aplicação e respeito a todos os níveis e em todos os campos; caso contrário, não obstante justas afirmações de princípio, corre-se o risco de cometer profundas injustiças contra os cidadãos que desejam professar e praticar livremente a sua fé.
A promoção de uma plena liberdade religiosa das comunidades católicas é também a finalidade que visa a Santa Sé quando conclui Concordatas ou outros Acordos. Alegro-me por Estados de várias regiões do mundo e de diferentes tradições religiosas, culturais e jurídicas terem escolhido o meio das convenções internacionais para organizar as relações entre a comunidade política e a Igreja Católica, estabelecendo através do diálogo o quadro de uma colaboração no respeito das recíprocas competências. No ano passado, foi concluído e entrou em vigor um Acordo para a assistência religiosa aos fiéis católicos das Forças Armadas na Bósnia Herzegovina, e atualmente estão em curso negociações em diversos países. Delas esperamos uma saída positiva, capaz de assegurar soluções respeitosas da natureza e da liberdade da Igreja para o bem da sociedade inteira.
De igual modo está ao serviço da liberdade religiosa a atividade dos Representantes Pontifícios junto dos Estados e das Organizações Internacionais. Com satisfação desejo assinalar que as autoridades vietnamitas aceitaram que eu designe um Representante, que há de, com as suas visitas, exprimir à querida comunidade católica deste país a solicitude do Sucessor de Pedro. Queria igualmente recordar que, durante o ano passado, a rede diplomática da Santa Sé se consolidou ainda mais na África, estando doravante assegurada uma presença estável em três países onde o Núncio não é residente. Ainda neste continente, irei visitar, se Deus quiser, o Benim no próximo mês de novembro, para entregar a Exortação Apostólica que recolherá os frutos dos trabalhos da Segunda Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos.
Diante deste ilustre auditório, quero por último reafirmar vigorosamente que a religião não constitui um problema para a sociedade, não é um fator de perturbação ou de conflito. Quero repetir que a Igreja não procura privilégios, nem deseja intervir em âmbitos alheios à sua missão, mas simplesmente exercer a mesma com liberdade. Convido cada um a reconhecer a grande lição da história: "Como se pode negar a contribuição das grandes religiões do mundo para o desenvolvimento da civilização? A busca sincera de Deus levou a um respeito maior da dignidade do homem. As comunidades cristãs, com o seu patrimônio de valores e princípios, contribuíram bastante para a tomada de consciência das pessoas e dos povos a respeito da sua própria identidade e dignidade, bem como para a conquista de instituições democráticas e para a afirmação dos direitos do homem e seus correlativos deveres. Também hoje, numa sociedade cada vez mais globalizada, os cristãos são chamados – não só através de um responsável empenhamento civil, econômico e político, mas também com o testemunho da própria caridade e fé – a oferecer a sua preciosa contribuição para o árduo e exaltante compromisso em prol da justiça, do desenvolvimento humano integral e do reto ordenamento das realidades humanas" (Mensagem para a Celebração da Jornada Mundial da Paz, 1 de Janeiro de 2011, n. 7).
Emblemática a este respeito é a figura da Beata Madre Teresa de Calcutá: o centenário do seu nascimento foi celebrado tanto em Tirana, Skopje e Pristina como na Índia; foi-lhe prestada uma vibrante homenagem não só pela Igreja, mas também pelas autoridades civis, os líderes religiosos e pessoas sem conta de todas as confissões. Exemplos como o dela mostram ao mundo quão benéfico é para a sociedade inteira o compromisso que nasce da fé.
Que nenhuma sociedade humana se prive, voluntariamente, da contribuição fundamental que são as pessoas e as comunidades religiosas! Como recordava o Concílio Vaticano II, assegurando a todos plenamente a justa liberdade religiosa, a sociedade poderá "gozar dos bens da justiça e da paz que derivam da fidelidade dos homens a Deus e à sua santa vontade" (Decl. Dignitatis humanae, 6). 
Por isso, ao mesmo tempo que formulo votos de um novo ano rico de concórdia e de real progresso, exorto a todos, responsáveis políticos, líderes religiosos e pessoas de todas as categorias, a empreenderem com determinação o caminho para uma paz autêntica e duradoura, que passa pelo respeito do direito à liberdade religiosa em toda a sua extensão.
Sobre este compromisso, cuja atuação necessita do esforço da família humana inteira, invoco a Bênção de Deus Onipotente, que realizou a nossa reconciliação com Ele e entre nós por meio do seu Filho Jesus Cristo, nossa paz (cf. Ef 2, 14).
Um Ano feliz para todos!

* Extraído do site do Vaticano, do dia 10 de janeiro de 2011. Revisado por Paulo R. A. Pacheco.

domingo, 17 de outubro de 2010

Comentário ao evangelho do dia

1ª Leitura - Ex 17,8-13
Naqueles dias, os amalecitas vieram atacar Israel em Rafidim. Moisés disse a Josué: "Escolhe alguns homens e vai combater contra os amalecitas. Amanhã estarei, de pé, no alto da colina, com a vara de Deus na mão". Josué fez o que Moisés lhe tinha mandado e combateu os amalecitas. Moisés, Aarão e Ur subiram ao topo da colina. E, enquanto Moisés conservava a mão levantada, Israel vencia; quando abaixava a mão, vencia Amalec. Ora, as mãos de Moisés tornaram-se pesadas. Pegando então uma pedra, colocaram-na debaixo dele para que se sentasse, e Aarão e Ur, um de cada lado sustentavam as mãos de Moisés. Assim, suas mãos não se fatigaram até ao pôr do sol, e Josué derrotou Amalec e sua gente a fio de espada.

2ª Leitura - 2Tm 3,14 - 4,2
Caríssimo, permanece firme naquilo que aprendeste e aceitaste como verdade; tu sabes de quem o aprendeste. Desde a infância conheces as Sagradas Escrituras: elas têm o poder de te comunicar a sabedoria que conduz à salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para ensinar, para argumentar, para corrigir e para educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e qualificado para toda boa obra. Diante de Deus e de Cristo Jesus, que há de vir a julgar os vivos e os mortos, e em virtude da sua manifestação gloriosa e do seu Reino, eu te peço com insistência: proclama a palavra, insiste oportuna ou importunamente, argumenta, repreende, aconselha, com toda paciência e doutrina. 

Evangelho - Lc 18,1-8
Naquele tempo, Jesus contou aos discípulos uma parábola, para mostrar-lhes a necessidade de rezar sempre, e nunca desistir, dizendo: "Numa cidade havia um juiz que não temia a Deus, e não respeitava homem algum. Na mesma cidade havia uma viúva, que vinha à procura do juiz, pedindo: 'Faze-me justiça contra o meu adversário!'. Durante muito tempo, o juiz se recusou. Por fim, ele pensou: 'Eu não temo a Deus, e não respeito homem algum. Mas esta viúva já me está aborrecendo. Vou fazer-lhe justiça, para que ela não venha a agredir-me!'". E o Senhor acrescentou: "Escutai o que diz este juiz injusto. E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar? Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa. Mas o Filho do homem, quando vier, será que ainda vai encontrar fé sobre a terra?".

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
Fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Toma gosto pela oração. Sente frequentemente a necessidade de rezar ao longo do dia. A oração dilata o coração, até que este possa receber o dom de Deus que é Ele próprio. Pede, procura, e o teu coração crescerá ao ponto de O receber e de O guardar como teu bem. Queremos tanto rezar bem e no entanto fracassamos. Então desanimamos e desistimos. Se queres rezar melhor, deves rezar mais. Deus aceita o fracasso, mas não quer desânimos. Ele quer que sejamos cada vez mais como crianças, cada vez mais humildes, cada vez mais cheios de gratidão na oração. Quer que nos recordemos da nossa pertença ao corpo místico de Cristo, que está em oração perpétua. Devemos ajudar-nos uns aos outros nas nossas orações. Libertemos o espírito. Não rezemos de forma muito prolongada; que as nossas orações não se alonguem indefinidamente, mas sejam breves, repletas de amor. Rezemos por aqueles que não rezam. Recordemo-nos de que aquele que quer ser capaz de amar tem de ser capaz de rezar. 

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Comentário ao evangelho do dia

Dedicação da Basílica de Santa Maria Maior

Evangelho - Mt 16, 13-23
Naquele tempo: Jesus foi à região de Cesaréia de Filipe e ali perguntou aos seus discípulos: "Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?". Eles responderam: "Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas". Então Jesus lhes perguntou: "E vós, quem dizeis que eu sou?". Simão Pedro respondeu: "Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo". Respondendo, Jesus lhe disse: "Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus". Jesus, então, ordenou aos discípulos que não dissessem a ninguém que ele era o Messias. Jesus começou a mostrar aos seus discípulos que devia ir à Jerusalém e sofrer muito da parte dos anciãos, dos sumos sacerdotes e dos mestres da Lei, e que devia ser morto e ressuscitar no terceiro dia. Então Pedro tomou Jesus à parte e começou a repreendê-lo, dizendo: "Deus não permita tal coisa, Senhor! Que isto nunca te aconteça!". Jesus, porém, voltou-se para Pedro, e disse: "Vai para longe, Satanás! Tu és para mim uma pedra de tropeço, porque não pensas as coisas de Deus mas sim as coisas dos homens!".

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
Fundadora das irmãs Missionárias da Caridade 

A confissão é um ato magnífico, um ato de grande amor. Só aí podemos entregar-nos enquanto pecadores, portadores de pecado, e só da confissão podemos sair como pecadores perdoados, sem pecado. A confissão nunca é mais do que humildade em ação. Antes chamávamos-lhe penitência mas trata-se na verdade de um sacramento de amor, do sacramento do perdão. Quando se abre uma brecha entre mim e Cristo, quando o meu amor faz uma fissura, qualquer coisa pode vir preencher essa falha. A confissão é esse momento em que eu permito a Cristo suprimir de mim tudo o que divide, tudo o que destrói. A realidade dos meus pecados deve vir primeiro. Quase todos nós corremos o perigo de nos esquecermos de que somos pecadores e de que nos devemos apresentar à confissão como tais. Devemos dirigir-nos a Deus para Lhe dizer quão pesarosos estamos de tudo o que possamos ter feito que O tenha magoado. O confessionário não é um local para conversas banais ou para tagarelices. Aí preside um único tema – os meus pecados, o meu arrependimento, como vencer as minhas tentações, como praticar a virtude, como crescer no amor a Deus. 

terça-feira, 27 de julho de 2010

Comentário ao evangelho do dia

Evangelho - Mt 13, 36-43
Naquele tempo: Jesus deixou as multidões e foi para casa. Seus discípulos aproximaram-se dele e disseram: "Explica-nos a parábola do joio!" Jesus respondeu: "Aquele que semeia a boa semente é o Filho do Homem. O campo é o mundo. A boa semente são os que pertencem ao Reino. O joio são os que pertencem ao Maligno. O inimigo que semeou o joio é o diabo. A colheita é o fim dos tempos. Os ceifadores são os anjos. Como o joio é recolhido e queimado ao fogo, assim também acontecerá no fim dos tempos: o Filho do Homem enviará os seus anjos e eles retirarão do seu Reino todos os que fazem outros pecar e os que praticam o mal; e depois os lançarão na fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes. Então os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai. Quem tem ouvidos, ouça".

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Não existem dois mundos, o mundo físico e o mundo espiritual; há apenas um: o Reino de Deus, "na Terra como no céu" (Mt 6, 10). Muitas pessoas dizem: "Pai Nosso que estais no céu", e pensam que Deus está lá em cima, o que reforça a ideia de uma separação entre os dois mundos. Os ocidentais gostam de distinguir a matéria do espírito. Mas a verdade é só uma, e o mesmo acontece com a realidade. Desde o momento em que admitimos a encarnação de Deus, que para os cristãos se realiza na pessoa de Jesus Cristo, começamos a levar as coisas a sério.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Comentário ao evangelho do dia

Evangelho - Mt 7, 1-5
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Não julgueis, e não sereis julgados. Pois, vós sereis julgados com o mesmo julgamento com que julgardes; e sereis medidos, com a mesma medida com que medirdes. Por que observas o cisco no olho do teu irmão, e não prestas atenção à trave que está no teu próprio olho? Ou, como podes dizer ao teu irmão: 'deixa-me tirar o cisco do teu olho', quando tu mesmo tens uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu próprio olho, e então enxergarás bem para tirar o cisco do olho do teu irmão".

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade 

Para cada doença existem vários medicamentos e tratamentos. Mas enquanto não se oferecer uma mão doce pronta a servir e um coração generoso pronto a acarinhar, não creio que se possa alguma vez curar esta terrível doença que é a falta de amor. Nenhum de nós tem o direito de condenar quem quer que seja. Nem quando vemos pessoas soçobrarem sem compreender porquê. Não nos convida Jesus a não julgar? Talvez tenhamos contribuído para tornar as pessoas como elas são. Devemos compreender que são nossos irmãos e nossas irmãs. Este leproso, este bêbado, este doente são nossos irmãos, também eles foram criados para um amor maior. Nunca deveríamos esquecê-lo. O próprio Jesus Cristo Se identifica com eles quando diz: "Aquilo que fizestes aos Meus irmãos mais humildes foi a Mim que fizestes" (Mt 25, 40). E pode acontecer que essas pessoas vivam na rua, desprovidas de qualquer amor e quaisquer cuidados, porque lhes recusamos a nossa solicitude, a nossa afeição. Sede doces, infinitamente doces para com o pobre que sofre. Compreendemos tão mal aquilo por que ele passa! O mais difícil é não ser aceito. 

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Comentário ao evangelho do dia


Visitação de Nossa Senhora

Evangelho - Lc 1,39-56
Naqueles dias, Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se, apressadamente, a uma cidade da Judéia. Entrou na casa de Zacarias e cumprimentou Isabel. Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança pulou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. Com um grande grito, exclamou: "Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre! Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar? Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança pulou de alegria no meu ventre. Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido, o que o Senhor lhe prometeu". Maria disse: "A minha alma engrandece o Senhor, e se alegrou o meu espírito em Deus, meu Salvador, pois, ele viu a pequenez de sua serva, eis que agora as gerações hão de chamar-me de bendita. O Poderoso fez por mim maravilhas e Santo é o seu nome! Seu amor, de geração em geração, chega a todos que o respeitam. Demonstrou o poder de seu braço, dispersou os orgulhosos. Derrubou os poderosos de seus tronos e os humildes exaltou. De bens saciou os famintos despediu, sem nada, os ricos. Acolheu Israel, seu servidor, fiel ao seu amor, como havia prometido aos nossos pais, em favor de Abraão e de seus filhos, para sempre". Maria ficou três meses com Isabel; depois voltou para casa.

Comentário feito por Bem-aventurada Teresa de Calcutá (1910-1997)
fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade

Depois de ter sido visitada pelo anjo, Maria foi ter com a sua prima Isabel, que estava grávida. E a criança que ia nascer, João Batista, saltou de alegria no seio de Isabel. Que maravilha! Deus todo poderoso escolheu uma criança que ia nascer para anunciar a vinda do Seu Filho! Pelo mistério da Anunciação e da Visitação, Maria representa o próprio modelo da vida que devíamos levar. Primeiro, acolheu Jesus na sua existência; depois, partilhou o que recebeu. Cada vez que recebemos a Sagrada Comunhão, Jesus, o Verbo, torna-Se carne na nossa vida - dom de Deus, ao mesmo tempo belo, gracioso, singular. Assim foi a primeira Eucaristia: o oferecimento por Maria do seu Filho, que estava nela, nela em quem Ele tinha estabelecido o primeiro altar. Maria, a única que podia afirmar com absoluta confiança: "Isto é o meu corpo", ofereceu, a partir deste primeiro momento, o seu próprio corpo, a sua força, todo o seu ser, para a formação do Corpo de Cristo. A nossa Mãe, a Igreja, elevou as mulheres a uma grande honra diante de Deus, ao proclamar Maria Mãe da Igreja.

domingo, 12 de abril de 2009

Homilia de Sua Santidade Bento XVI - Vigília de Páscoa

Posto, tal e qual foi publicada no site do Vaticano, a homilia do Papa Bento XVI, na Vigília de Páscoa - 11 de abril de 2009 -, na Basílica de São Pedro, em Roma.

Basílica de São Pedro
Sábado Santo, 11 de Abril de 2009

Amados irmãos e irmãs!
Narra São Marcos no seu Evangelho que os discípulos, ao descer do monte da Transfiguração, discutiam entre si o que queria dizer "ressuscitar dos mortos" (cf. Mc 9, 10). Antes, o Senhor tinha-lhes anunciado a sua paixão e a ressurreição três dias depois. Pedro tinha protestado contra o anúncio da morte. Mas agora interrogavam-se acerca do que se poderia entender pelo termo "ressurreição". Porventura não acontece o mesmo também a nós? O Natal, o nascimento do Deus Menino de certo modo é-nos imediatamente compreensível. Podemos amar o Menino, podemos imaginar a noite de Belém, a alegria de Maria, a alegria de São José e dos pastores e o júbilo dos Anjos. Mas, a ressurreição: o que é? Não entra no âmbito das nossas experiências, e assim a mensagem frequentemente acaba, em qualquer medida, incompreendida, algo do passado. A Igreja procura levar-nos à sua compreensão, traduzindo este acontecimento misterioso na linguagem dos símbolos pelos quais nos seja possível de algum modo contemplar este facto impressionante. Na Vigília Pascal, indica-nos o significado deste dia sobretudo através de três símbolos: a luz, a água e o cântico novo do aleluia.
Temos, em primeiro lugar, a luz. A criação por obra de Deus – acabámos de ouvir a sua narração bíblica – começa com as palavras: "Haja luz!" (Gen 1, 3). Onde há luz, nasce a vida, o caos pode transformar-se em cosmos. Na mensagem bíblica, a luz é a imagem mais imediata de Deus: Ele é todo Resplendor, Vida, Verdade, Luz. Na Vigília Pascal, a Igreja lê a narração da criação como profecia. Na ressurreição, verifica-se de modo mais sublime aquilo que este texto descreve como o início de todas as coisas. Deus diz de novo: "Haja luz". A ressurreição de Jesus é uma irrupção de luz. A morte fica superada, o sepulcro escancarado. O próprio Ressuscitado é Luz, a Luz do mundo. Com a ressurreição, o dia de Deus entra nas noites da história. A partir da ressurreição, a luz de Deus difunde-se pelo mundo e pela história. Faz-se dia. Somente esta Luz – Jesus Cristo – é a luz verdadeira, mais verdadeira que o fenómeno físico da luz. Ele é a Luz pura: é o próprio Deus, que faz nascer uma nova criação no meio da antiga, transforma o caos em cosmos.
Procuremos compreender isto um pouco melhor ainda. Porque é que Cristo é Luz? No Antigo Testamento, a Torah era considerada como a luz vinda de Deus para o mundo e para os homens. Aquela separa, na criação, a luz das trevas, isto é, o bem do mal. Aponta ao homem o caminho justo para viver de modo autêntico. Indica-lhe o bem, mostra-lhe a verdade e conduz-lo para o amor, que é o seu conteúdo mais profundo. Aquela é "lâmpada" para os passos, e "luz" no caminho (cf. Sal 119/118, 105). Ora, os cristãos sabiam que, em Cristo está presente a Torah: a Palavra de Deus está presente nEle como Pessoa. A Palavra de Deus é a verdadeira Luz de que o homem necessita. Esta Palavra está presente nEle, no Filho. O Salmo 19 comparara a Torah ao sol, que, nascendo, manifesta a glória de Deus visivelmente em todo o mundo. Os cristãos compreendem: sim, na ressurreição, o Filho de Deus surgiu como Luz sobre o mundo. Cristo é a grande Luz, da qual provém toda a vida. Ele faz-nos reconhecer a glória de Deus de um extremo ao outro da terra. Indica-nos a estrada. Ele é o dia de Deus que agora, crescendo, se difunde por toda a terra. Agora, vivendo com Ele e por Ele, podemos viver na luz.
Na Vigília Pascal, a Igreja representa o mistério da luz de Cristo no sinal do círio pascal, cuja chama é simultaneamente luz e calor. O simbolismo da luz está ligado com o do fogo: resplendor e calor, resplendor e energia de transformação contida no fogo. Verdade e amor andam juntos. O círio pascal arde e deste modo se consuma: cruz e ressurreição são inseparáveis. Da cruz, da autodoacção do Filho nasce a luz, provém o verdadeiro resplendor sobre o mundo. No círio pascal, todos acendemos as nossas velas, sobretudo as dos neo-batizados, aos quais, neste sacramento, a luz de Cristo é colocada no fundo do coração. A Igreja Antiga designou o Batismo como fotismos, como sacramento da iluminação, como uma comunicação de luz e ligou-o inseparavelmente com a ressurreição de Cristo. No Batismo, Deus diz ao batizando: "Haja luz". O batizando é introduzido dentro da luz de Cristo. Cristo divide agora a luz das trevas. NEle reconhecemos o que é verdadeiro e o que é falso, o que é o resplendor e o que é a escuridão. Com Ele, surge em nós a luz da verdade e começamos a compreender. Uma vez quando Cristo viu a gente que se congregara para O escutar e esperava dEle uma orientação, sentiu compaixão por ela, porque eram como ovelhas sem pastor (cf. Mc 6, 34). No meio das correntes contrastantes do seu tempo, não sabiam a quem dirigir-se. Quanta compaixão deve Ele sentir também do nosso tempo, por causa de todos os grandes discursos por trás dos quais, na realidade, se esconde uma grande desorientação! Para onde devemos ir? Quais são os valores, segundo os quais podemos regular-nos? Os valores segundo os quais podemos educar os jovens, sem lhes dar normas que talvez não subsistam nem exigir coisas que talvez não lhes devam ser impostas? Ele é a Luz. A vela baptismal é o símbolo da iluminação que nos é concedida no Batismo. Assim, nesta hora, também São Paulo nos fala de modo muito imediato. Na Carta aos Filipenses, diz que, no meio de uma geração má e perversa, os cristãos deveriam brilhar como astros no mundo (cf. Fil 2, 15). Peçamos ao Senhor que a pequena chama da vela, que Ele acendeu em nós, a luz delicada da sua palavra e do seu amor no meio das confusões deste tempo não se apague em nós, mas torne-se cada vez mais forte e mais resplendorosa. Para que sejamos com Ele pessoas do dia, astros para o nosso tempo.
O segundo símbolo da Vigília Pascal – a noite do Batismo – é a água. Esta aparece, na Sagrada Escritura e consequentemente também na estrutura íntima do sacramento do Batismo, com dois significados opostos. De um lado, temos o mar que se apresenta como o poder antagonista da vida sobre a terra, como a sua contínua ameaça, à qual, porém, Deus colocou um limite. Por isso o Apocalipse, ao falar do mundo novo de Deus, diz que lá o mar já não existirá (cf. 21, 1). É o elemento da morte. E assim torna-se a representação simbólica da morte de Jesus na cruz: Cristo desceu aos abismos do mar, às águas da morte, como Israel penetrou no Mar Vermelho. Ressuscitado da morte, Ele dá-nos a vida. Isto significa que o Batismo não é apenas um banho, mas um novo nascimento: com Cristo, como que descemos ao mar da morte para dele subirmos como criaturas novas.
O outro significado com que encontramos a água é como nascente fresca, que dá a vida, ou também como o grande rio donde provém a vida. Segundo o ordenamento primitivo da Igreja, o Batismo devia ser administrado com água fresca de nascente. Sem água, não há vida. Impressiona a grande importância que têm na Sagrada Escritura os poços. São lugares donde brota a vida. Junto do poço de Jacó, Cristo anuncia à Samaritana o poço novo, a água da vida verdadeira. Manifesta-Se a ela como o novo e definitivo Jacó, que abre à humanidade o poço que esta aguarda: aquela água que dá a vida que jamais se esgota (cf. Jo 4, 5-15). São João narra-nos que um soldado feriu com uma lança o lado de Jesus e que, do lado aberto – do seu coração trespassado –, saiu sangue e água (cf. Jo 19, 34). Nisto, a Igreja Antiga viu um símbolo do Batismo e da Eucaristia, que brotam do coração trespassado de Jesus. Na morte, Jesus mesmo Se tornou a nascente. Numa visão, o profeta Ezequiel tinha visto o Templo novo, do qual jorra uma nascente que se torna um grande rio que dá a vida (cf. Ez 47, 1-12); para uma Terra que sempre sofria com a seca e a falta de água, esta era uma grande visão de esperança. A cristandade dos primórdios compreendeu: em Cristo, realizou-se esta visão. Ele é o Templo verdadeiro, o Templo vivo de Deus. E é também a nascente de água viva. DEle brota o grande rio que, no Batismo, faz frutificar e renova o mundo; o grande rio de água viva é o seu Evangelho que torna fecunda a terra. Mas, num discurso durante a Festa das Tendas, Jesus profetizou uma coisa ainda maior: "Do seio daquele que acreditar em Mim, correrão rios de água viva" (Jo 7, 38). No Batismo, o Senhor faz de nós não só pessoas de luz, mas também nascentes das quais brota água viva. Todos nós conhecemos tais pessoas que nos deixam de algum modo restaurados e renovados; pessoas que são como que uma fonte de água fresca borbotante. Não devemos necessariamente pensar a pessoas grandes como Agostinho, Francisco de Assis, Teresa de Ávila, Madre Teresa de Calcutá e assim por diante, pessoas através das quais verdadeiramente rios de água viva penetraram na história. Graças a Deus, encontramo-las continuamente mesmo no nosso dia a dia: pessoas que são uma nascente. Com certeza, conhecemos também o contrário: pessoas das quais emana um odor parecido com o dum charco com água estagnada ou mesmo envenenada. Peçamos ao Senhor, que nos concedeu a graça do Batismo, para podermos ser sempre nascentes de água pura, fresca, saltitante da fonte da sua verdade e do seu amor.
O terceiro grande símbolo da Vigília Pascal é de natureza muito particular; envolve o próprio homem. É a entoação do cântico novo: o aleluia. Quando uma pessoa experimenta uma grande alegria, não pode guardá-la para si. Deve manifestá-la, transmiti-la. Mas que sucede quando a pessoa é tocada pela luz da ressurreição, entrando assim em contacto com a própria Vida, com a Verdade e com o Amor? Disto, não pode limitar-se simplesmente a falar; o falar já não basta. Ela tem de cantar. Na Bíblia, a primeira menção do acto de cantar encontra-se depois da travessia do Mar Vermelho. Israel libertou-se da escravidão. Subiu das profundezas ameaçadoras do mar. É como se tivesse renascido. Vive e é livre. A Bíblia descreve a reacção do povo a este grande acontecimento da salvação com a frase: "O povo acreditou no Senhor e em Moisés, seu servo" (Ex 14, 31). Segue-se depois a segunda reacção que nasce, por uma espécie de necessidade interior, da primeira: "Então Moisés e os filhos de Israel cantaram este cântico ao Senhor…". Na Vigília Pascal, ano após ano, nós, cristãos, depois da terceira leitura entoamos este cântico, cantamo-lo como o nosso cântico, porque também nós, pelo poder de Deus, fomos tirados para fora da água e libertos para a vida verdadeira.
Para a história do cântico de Moisés depois da libertação de Israel do Egito e depois da subida do Mar Vermelho, há um paralelismo surpreendente no Apocalipse de São João. Antes de iniciarem os últimos sete flagelos impostos à terra, aparece ao vidente "uma espécie de mar de cristal misturado com fogo. Sobre o mar de cristal, estavam de pé os vencedores do Monstro, da sua imagem e do número do seu nome. Tinham na mão harpas divinas e cantavam o cântico de Moisés, o servo de Deus, e o cântico do Cordeiro…" (Ap 15, 2s). Com esta imagem, é descrita a situação dos discípulos de Jesus em todos os tempos, a situação da Igreja na história deste mundo. Considerada humanamente, tal situação é contraditória em si mesma. Por um lado, a comunidade encontra-se no Êxodo, no meio do Mar Vermelho. Num mar que, paradoxalmente, é ao mesmo tempo gelo e fogo. E não deve porventura a Igreja caminhar sempre sobre o mar através do fogo e do frio? Humanamente falando, deveria afundar. Mas não, e enquanto caminha ainda no meio deste Mar Vermelho, ela canta – entoa o cântico de louvor dos justos: o cântico de Moisés e do Cordeiro, no qual concordam a Antiga e a Nova Aliança. Enquanto, na realidade deveria afundar, a Igreja entoa o cântico de agradecimento dos redimidos. Está sobre as águas de morte da história e todavia já está ressuscitada. Cantando, ela agarra-se à mão do Senhor, que a sustenta por cima das águas. E sabe que deste modo é guindada fora da força de gravidade da morte e do mal – uma força da qual, sem tal intervenção, não haveria caminho algum de fuga – guindada e atraída para dentro da nova força de gravidade de Deus, da verdade e do amor. De momento, ela encontra-se ainda entre os dois campos gravitacionais. Mas desde que Jesus ressuscitou, a gravitação do amor é mais forte que a do ódio; a força de gravidade da vida é mais forte que a da morte. Porventura não é esta a situação da Igreja de todos os tempos? Sempre dá a impressão que ela deva afundar, e todavia já está salva. São Paulo ilustrou esta situação com as palavras: "Somos considerados (…) como agonizantes, embora estejamos com vida" (2 Cor 6, 9). A mão salvadora do Senhor nos sustenta e assim podemos cantar já agora o cântico dos redimidos, o cântico novo dos ressuscitados: Aleluia! Amen.