"Pergunta: Eu gostaria de saber: a liberdade é o fruto que o Senhor nos dá, mas é também a condição inicial para aderir a este fato. Entre as duas coisas há um caminho, no sentido de que tanto mais eu adiro e tanto mais me torno livre. Neste caminho, então, quem me salva dos erros que eu cometo? Poderia dizer que é a misericórdia?
Giussani: Quem?
Pergunta: Quem me salva!
Giussani: Quem salva você é aquela Presença, certamente; exatamente por isso se chama misericórdia. A palavra misericórdia é a última palavra que define o Deus vivo, que nenhuma religião nunca poderia ter imaginado. A extrema antítese da imagem de Deus comparada à imagem de perfeição que temos, à ideia de justiça que temos, é o perdão; tanto é verdade que nós não somos capazes de perdoar, a não ser que se nos torne familiar a Sua presença, então nos tornamos verdadeiramente capazes de perdão, nos tornamos como Deus.
Pergunta: Pode explicar, por favor, o reconhecimento? Eu sempre pensei que uma pessoa reconhece a partir dos frutos que vê, ou seja daquilo que, antes, vê.
Giussani: Certo, do fruto que vê, você fica 'alarmado' e forçado a reconhecer uma Presença: reconhece os frutos e, portanto, reconhece a planta, isto é a Presença. A Presença, o Ser é presente onde opera, onde age. Você vê, ou melhor ouve um relincho, e diz: 'ali tem um cavalo'. Como você o escutou vindo da esquerda, você diz: 'O cavalo está aqui, à esquerda'. E eu diria que quanto mais você experimenta os frutos desta adesão em você, tanto mais se torna convicção a adesão, o reconhecimento.
Pergunta: Por que o senhor dizia, antes, que é errado ficarmos desiludidos com algo que não acontece? No início da palestra o senhor dizia que há um modo psicológico de pedir a mudança!
Giussani: Não, não acredito que eu tenha dito assim. Creio que eu disse que a mudança não acontece quando forçamos a nossa vontade, isto é em nível psicológico; e, de fato, é o reconhecimento de uma Presença... que é outra coisa. É o reconhecimento de uma Presença a nossa verdadeira mudança, é a fé. Isto leva consigo qualquer outra mudança. Quer dizer que a mudança é reconhecer que há Alguém, um homem ressuscitado há dois mil anos atrás, que é contemporâneo a todos os anos e momentos da história: Cristo.
Pergunta: O senhor disse: 'Então, a pessoa arrisca de modo incessante: anuncio mil vezes, ninguém me ouve, e eu anuncio outra vez. Esse comportamento indomável em si é a vitória sobre o tempo'. Pode explicar isso melhor?
Giussani: Digo que se há aquela Presença, se é minha a vitória, se é minha porque Cristo é meu, como disse Dionísio Areopagita: 'Oh, se posso dizer assim, meu Cristo'... Que grandeza humana! 'Oh, se posso dizer assim, meu Cristo.' É o mesmo que ele disse, depois, em um outro pensamento seu: 'Quem saberá falar do amor ao homem próprio de Cristo, transbordante de paz?'. Por isso, Cristo tem uma única razão: 'Vinde e vede', sigam. E a promessa é a paz, que quer dizer ter as coisas todas no seu lugar, no rumo do seu destino; tudo no lugar, no rumo do destino. O oposto da paz não é a guerra, mas o medo. (...)
Então, a presença de Cristo que é meu, a segurança da vitória, porque é minha a vitória, porque a vitória é Cristo ressuscitado, me dá ânimo. 'Olha só, você chama a minha atenção - 'você diz as coisas e, depois, não faz' -, mas não consegue me desmontar, não me desmonta: eu erro milhões de vezes por dia, mas retomo milhões de vezes'. Este é exatamente o divino no humano. É isto o que quer dizer que a moralidade não é mais moralismo, porque a moralidade é a tensão que você vive, é a vida."
(GIUSSANI, Luigi. Qui e ora (1984-1985). 2009, pp. 84-87).
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