quarta-feira, 17 de março de 2010

40 dias com Giussani

"Diante da explosão da hipótese do Mistério, da presença do Mistério que nasce, no tempo e no espaço, num certo ponto do tempo e do espaço, nas vísceras de uma mulher como todo homem nasce, diante disso, a atração das coisas se exalta, não se entorpece, não se torna opaca. Tanto é verdade que (...), enquanto os outros só veem um cão podre, Jesus só vê os dentes brancos, que revelam o seu esplendor (faz referência a um texto entitulado "The unwritten Gospel. Ana and Agrapha of Jesus", organizado por R. Dunkerley, publicado em 1925, pela editora inglesa Allen and Unwin Ltd.; ndt). Por sua natureza, quanto mais você vê a atração do ser numa realidade, tanto mais a atração se multiplica imediatamente, se eterniza em contato com o presença reconhecida de Cristo. Começa a se fazer sentir, em toda a realidade, a consistência do Eterno. De fato, diante do filho morto, Cristo diz à mãe 'você o verá novamente; não apenas você não o perdeu, mas agora ele é mais próximo de você que antes'. Que é o que eu percebi pela primeira vez, nitidamente, indo ao funeral do meu pobre pai, com os primeiros cento e dois da GS milanesa (refere-se a Giuventù Studentesca - Juventude Estudantil -, movimento a que Luigi Giussani deu vida nos anos 1950 no Liceu Berchet de Milão. Posteriormente, esse movimento eclesial começou a se chamar Comunhão e Libertação, hoje presente em toda a Itália e em mais de 70 países de todo o mundo; ndt), que tinham entrado no nosso movimento (...). Num certo momento, eu entendi: 'Você está presente mais do que antes, agora você está muito mais presente do que antes, agora você me vê, me descobre, me lê, me ajude!'. Desde então sempre falei assim com meu pai, algumas vezes com mais vergonha, mas sempre com certeza. Sem estas certezas o mundo seria uma mentira, a criação uma infâmia e a vida uma corrupção. 'Corrupção': não sei ainda, com exatidão, qual é a etimologia desta palavra, porque 'corrompo' quer dizer romper-se nas partes de que é feito, cum-rompere; ou cum-ruo que é uma derivação que eu gosto mais, porque corruo é como ver um corpo vivo que morre, e tão logo morre, se tivessem um microscópio, veriam que toda a carne se torna verme (...). A vida seria uma tal corrupção? Não! É muita mentira se estamos diante daquilo que o homem consegue criar. Vejam, por exemplo, na Capela Sistina, o Pai pintado por Michelangelo criando o homem; se vocês estão na distância certa (se quiserem vê-lo de verdade), é algo que parece ter sido transportado de outro mundo, e no entanto é nada perto do Deus infinito. Mas, tudo bem, se para poder determinar melhor essa pintura, para poder ser mais seguros, absolutamente certos, não céticos ou niilistas, mas seguros, colocamos o olhos sobre cada centímetro, como se fossemos míopes, ficaríamos um dia inteiro, constatando a existência de centenas e milhares de manchas: de perto, vocês veem as manchas. Afirmando o mistério, pelo contrário, não se perde nem mesmo um cabelo da cabeça. 'Também os cabelos da vossa cabeça estão numerados', disse Jesus, e 'Não será perdida nem mesmo uma palavra dita por brincadeira'. Fora dessa hipótese, sim, o niilismo domina tudo, destruindo tudo; esta destruição é uma escolha a priori, desesperada ou malvada (...), é contra o que existe. É contra minha mãe, é contra meu pai (...). O niilismo me destruiria todas as páginas de Dostoievsky. Queimamos tudo?! 'Agora, diz-me: como um homem que tem nas mãos tudo, menos o perdão, pode esperar?'. A última consequência do niilismo é a imperdoabilidade da culpa, algo atroz. Segundo penso, todos os psiquismos, todas as doenças psíquicas derivam disso: a imperdoabilidade da culpa."
(GIUSSANI, Luigi. Avvenimento di libertá: conversazioni con giovani universitari. 2002, pp. 27-29)

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