sábado, 5 de junho de 2010

Pesquisa e desenvolvimento


Crise, o desafio das universidades para ajudar os jovens de talento

Por Catharine Drew Gilpin Faust*

Em um cenário de crise global, assistimos a uma mudança no papel assumido pelas universidades. As nossas responsabilidades crescem nesse período histórico que somos chamados a enfrentar. Não podemos nos limitar ao papel de custodes das tradições históricas e da orgulhosa excelência de Harvard. É necessário nos perguntar o que desejamos que haja para além da recessão e da crise, quando o mundo poderá ser, de novo, dito normalizado.
Desejo deter-me brevemente sobre três características essenciais da universidade. Primeira: as universidades americanas foram, por muito tempo, consideradas uma oficina de oportunidades e de excelência. A instrução sempre foi considerada um ponto fundamental do "sonho americano", desde o nascimento da nossa nação. Todavia, os custos cada vez mais altos das universidades colocaram a duras provas os recursos econômicos das famílias. Garantir a acessibilidade à instrução superior é fundamental para o país e também é decisivo para Harvard; não apenas é uma questão de equidade, mas também de excelência.
O nosso sustento aos estudantes de talento constitui, portanto, uma parte essencial da nossa identidade, visto que estamos convencidos de que as melhores ideias não provêm de uma classe social particular ou de fatores étnicos, e de que não têm nenhuma relação com o sexo ou o lugar de origem. Mesmo diante de recursos limitados é, por isso, necessário agir de modo que os estudantes de talento tenham universidade de talento e vice-versa.
Segunda: as universidades são lugar privilegiado para a pesquisa nos Estados Unidos. Todavia, já em 2007 um relatório da National Academy of Sciences advertia que eram poucos os estudantes que escolhiam matérias científicas ou que encontravam o sustento necessário para levar a frente e desenvolver a própria carreira; enquanto que eram muitos aqueles que escolhiam âmbitos de pesquisa seguros para se garantirem do ponto de vista de fundos financeiros. A crise financeira apenas evidenciou problemas que já eram evidentes quanto ao que respeita ao futuro da pesquisa científica nos Estados Unidos.
Em Harvard, portanto, nos temos perguntado como sustentar a ciência no quadro destas condições econômicas modificadas, encontramo-nos num momento em que formulamos novos métodos de colaboração com fundações, indústrias e com outras instituições acadêmicas próximas a nós.
Terceira: as universidades têm a função de consciência crítica da sociedade. A nossa função não é apenas a de produzir conhecimento, mas também de gerar dúvidas, que afundam as raízes na incessante necessidade de se colocar perguntas em contraste com uma postura de dócil aceitação de um saber acrítico.
Tenho medo de que, como universidade, não tenhamos feito tudo o que poderíamos ter feito para colocar todas aquelas perguntas necessárias para tornar evidentes os riscos intrínsecos a cada uma das escolhas financeiras tomadas em tempos de bem-estar econômico difundido, quando o mundo se extasiava numa bolha de materialismo e falsa propriedade.
A potenciação do nosso papel como consciência crítica deve evidenciar-se também no âmbito do ensino que oferecemos aos nossos estudantes, com o objetivo de desconstruir as opiniões adquiridas, de colocar em discussão seus costumes, para ajudá-los a conquistar aquele estudo e aquela compreensão de si mesmos que da dúvida conduz à sabedoria.
Universidades como oficinas de oportunidades; universidades como lugares principais da pesquisa científica na América; universidades como divulgadoras da verdade: são estes os três aspectos essenciais dos desafios que se nos oferecem nessa nova era.

* Reitora da Universidade de Harvard. Síntese da intervenção que será publicada no próximo número de "Atlantide", revista quadrimestral dirigida por Giorgio Vittadini. Publicada no jornal Il Messaggero, do dia 04 de junho de 2010 (p. 22). Traduzida por Paulo R. A. Pacheco.

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