quarta-feira, 23 de março de 2011

Por trás do abandono, a crise de um desejo “impotente”


Por Salvatore Abbruzzese

Os dados sobre o abandono escolar fazem refletir e preocupam, não apenas devido à sua extensão, mas também devido à sua capacidade de atravessar a Itália inteira, a ponto de não poder ser confinado apenas às áreas frágeis do país, nem podem ser remetidos aos contextos sociais mais desfavorecidos. Mesmo querendo levar em consideração aquela cota consistente dos que, trabalhando no escuro, aparecem como inativos (e, portanto, a cifra de 120 mil apresentada pela investigação de Tuttoscuola pode ser, consistentemente, reduzida), o dado não deixa de ser preocupante. Quando se abandonam as escolas, os institutos técnicos e os centros de formação profissional, quando se fecham os cadernos na metade de um percurso e se levam os livros para a garagem, se está diante de um juízo de inutilidade que diz respeito ao coração mesmo do percurso formativo e de inserção social. Não se percebe apenas a falta de eficácia do título de estudo, mas a inutilidade do processo cognoscitivo em si.
Tal problema não é, de fato, apenas de caráter escolar. Quando, a um semelhante juízo negativo sobre o próprio percurso formativa vem acompanhada uma falta de inserção no mundo do trabalho, então pelo menos uma parte do problema se refere a um contexto que vai para além das salas de aula escolar. Observando a partir do plano dos processos culturais de médio prazo, não há dúvida de como é exatamente a vontade de crescimento de toda uma sociedade, com as suas motivações e seus projetos, que está em vias de transformação. É notável como o impulso dos anos 1960 – aqueles que, na França, são chamados os “trinta gloriosos”, ou seja, os anos entre 1945 e 1975 – tenha se exaurido completamente no plano econômico; poucos parecem se dar conta de como, inclusive, tenha se exaurido também no plano cultural e moral.
O trabalho, assim com o mercado o oferece hoje, ligado a tarefas fragmentadas, genéricas e pouco qualificadas, mesmo quando fornece uma autonomia econômica pessoal, não funda a possibilidade de uma independência efetiva. No entanto, o problema da falta de inserção no mundo do trabalho não reside na insuficiência deste último na capacidade de garantir uma inserção adequada e permitir uma autonomia efetiva. Na realidade, é possível – e sempre foi – trabalhar, suportar o baixo salário do primeiro, segundo e terceiro trabalhos, dedicar-se a tarefas marginais e mal remuneradas (obviamente dentro de determinados limites). Foi o que aconteceu às gerações precedentes.
A diferença reside no fato de que aquelas gerações enfrentavam a precariedade em função de um projeto mais amplo de promoção profissional e de emancipação pessoal, um projeto do qual o trabalho era apenas um componente. Em outros termos, sempre foi possível trabalhar com poucos ganhos, desde que o trabalho constituísse apenas uma parte do próprio percurso de vida, e desde que este último coincidisse com um projeto pessoal, com um desejo elementar de realização, de promoção de si próprio e dos próprios objetivos: quer estes fossem a simples emancipação profissional e econômica, ou, pelo contrário, fossem a verdadeira e efetiva promoção pessoal, fundada sobre competências adquiridas ou adquiríveis.
Quando se está diante de um abandono tanto do estudo quanto do trabalho, a verdadeira emergência se torna a de uma crescente incapacidade de estruturar o próprio desejo de realização. O problema fundamental consiste exatamente no fato de que os objetivos mínimos, que desde sempre sustentaram as vontades de emancipação da família de origem e de inserção profissional, não são mais, hoje em dia, percebidos como eram no passado. Falta a formalização do desejo, a sua tradução no plano operativo: o realismo crítico degenera rapidamente na renúncia a toda dimensão realizadora, uma renúncia que, num contexto de escassa tensão moral, conduz rapidamente à inatividade.
É possível trabalhar mesmo num contexto de precariedade e de dependência, quando o trabalho consente que se adquiram competências percebidas como importantes, ou mesmo quando consente que se siga um percurso de formação paralelo, subjetivamente percebido como significativo (é o caso dos estudantes-trabalhadores). É possível suportar toda precariedade ou insatisfação quando se tem no bolso e no coração um projeto de vida para o qual aquele mesmo trabalho pode ser funcional, ou que, pelo menos, não seja um obstáculo.
Por trás das dezenas de milhares de abandonos escolares que não são resolvidos com uma inserção no mercado de trabalho substancial, há algo de mais grave do que a simples insatisfação escolar. Na realidade, há uma incapacidade (ou uma renúncia) dos sujeitos em definir o próprio desejo, está presente uma crise de projetualidade que transita, e este é o verdadeiro drama, em direção a um subdimensionamento da própria existência, onde o cotidiano basta a si e mesmo o pensar no futuro é tomado como um puro (e inútil) exercício de fantasia. A possibilidade de poder prolongar a própria permanência na família de origem permite uma semelhante atitude de prolongar-se ao infinito e de parar, em parte, somente diante do trabalho fixo, possivelmente numa estrutura pública, pronta para suportar e tolerar uma postura que, seja como for, continuará sendo substancialmente renunciadora.
Mas, se esta é a chave para compreender o tipo de problema que se está delineando, parece então importante mover a roda ruma a uma direção completamente nova. É preciso uma reviravolta antropológica, capaz de provocar uma recuperação da atenção pela dimensão projetual, onde por projeto se entende o simples e elementar desejo de realização pessoal, consequência direta de uma visão não redutiva de si próprio. É preciso que educadores e pais saibam restituir ao sujeito a paixão por uma realização que nunca é somente profissional, mas também pessoal e existencial.
O problema não tem, portanto, a sua própria solução em meio aos programas escolares, mesmo que a escola deva ser, de qualquer forma, consciente dele. Isso não se reduz à escola de dar ou não, na escola, uma formação imediatamente profissionalizante ou, pelo contrário, fornecer os elementos de uma tradição humanista comum. Ambos são inúteis se não concorrem para alimentar uma dignidade e uma consciência daquilo que o sujeito é chamado a ser, reconhecendo e perseguindo objetivos realizáveis que não podem ser suprimidos.
Uma escola orientada em sentido estritamente profissionalizante, pressupondo que o universo do trabalho tenha, em si, ainda hoje, as motivações para bastar a si mesmo e o sujeito não deva, portanto, dotar-se de um percurso de formação mais amplo, é de fato simplesmente ingênua (são exatamente os institutos profissionalizantes que registram as taxas mais altas de abandono). Por sua vez, uma formação humanista que não desenvolva capacidades concretas (saber redigir, refletir, expor e argumentar, conhecendo o que já foi dito, ou seja, uma específica tradição de pensamento) acaba por decair na pura erudição, se tornando assim não apenas inútil, como também enganosa e danosa, na medida em que olha para o dedo que indica a lua, mais do que para a lua mesma.
A recuperação da geração cinza, que abandonou a escola sem entrar no mundo do trabalho, passa pela recuperação do direito de cada um de construir e edificar. Implica considerar tal direito como um elemento fundamental e inalienável da existência humana, um aspecto não negociável de realização da pessoa, a sua constituição deve ser parte integrante do percurso educativo e de formação. Uma sociedade avançada como a Itália é profunda e intimamente ligada a uma cultura do crescimento e da formação permanentes; e essa cultura é indissociável da imagem de um sujeito que deseja, e desejando, constrói, põe a mão na massa, consciente da cultura e da memória das quais é herdeiro.
Uma sociedade que se esquece de tal objetivo, uma escola que não leva em consideração tal necessidade, devem se preparar para um embate com uma cota crescente de indiferentes, até chegar ao ponto das salas de aula vazias.

* Extraído do IlSussidiario.net, do dia 22 de março de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

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