sábado, 9 de abril de 2011

Cartas do P.e Aldo 187

Asunción, 8 de abril de 2011.

Caros amigos,
“Deus ama mais a nossa liberdade do que a nossa salvação”, nos dizia Dom Giussani. Nestes dias, não apenas Paolino e eu, mas todos experimentamos o que significa esta provocação que desmascara a nossa possessividade, a nossa pretensão sobre os outros, talvez até com a sutil desculpa de que seja pelo bem deles. Anna Maria é uma garota muito bonita de quinze anos, e tenho sua adoção judicial... no domingo à noite, ela fugiu da “Casinha de Belém” com Marta, de dezessete anos, a mãe da pequena Lúcia, a menina que morreu alguns meses atrás na nossa clínica. Imaginem o que significou para mim e para Paolino em particular. Pensem no que vocês experimentariam se uma filha fugisse de casa. A dor foi grande, porém cheia de uma liberdade desconhecida antes, aquela liberdade que é uma total entrega ao Mistério e que se torna oração. Nós a procuramos, mas nada...
Às três da madrugada, Marta retornou e foi acolhida com alegria pela “mãe adotiva”, mas não tínhamos ainda nenhuma notícia de Anna Maria. No dia seguinte, segunda-feira, avisamos a polícia e o juiz responsável pelo caso, que emitiu uma ordem de captura.
Foram dias, horas sem fim, cheios de preocupação e também de uma certa raiva, devida aos mil porquês e pretensões que trazíamos dentro do coração. É o humano em todas as suas dimensões que, porém, não cessa de ser grito, oração, súplica. A impotência é total. A primeira noite, para mim, foi um pesadelo, mas as confiança na Providência era total. Na total impotência, eu sentia que o meu amor devia prestar contas com a liberdade de Anna Maria. Mas, que desafio! Que dureza! Amar a liberdade dos próprios filhos mais do que sua salvação... se você não for tomado pelo Mistério, isso não é possível; se o seu eu não é um “eu sou Tu que me fazes”, não é nem mesmo hipotetizável uma posição assim. Mas, graças a Nossa Senhora, para mim, esta certeza é dura como uma pedra, de forma que vence sempre. E, hoje, quarta-feira, a bela notícia: Marcelo, seu professor, a viu numa rua. Imediatamente, sai para buscá-la. Quando cheguei, agarrou-se, literalmente, à minha pobre pessoa e eu a levei para casa, para a nossa casa. Eu a olhava e acariciava. Estava muito bonita no seu cansaço. Somente algumas palavras, com as quais eu perguntei se alguém lhe havia feito mal. Depois, dei-lhe um chocolate, como Giussani fez comigo naquele dia, rezamos uma Ave Maria. Chamei Paolino, que a abraçou com uma grande ternura. Em seguida, chamamos Diana, a mãe adotiva, da “Casinha de Belém” número 2, para que a levasse para um banho e para dormir, deixando para o dia seguinte todo o resto. A psicólogo a esperava com as perguntas de sempre, mas Paolino, brigando, disse: “os psicólogos somos nós, por isso, vamos fazer festa e, agora, ela deve dar uma boa dormida”. Quando demos boa noite, perguntamos: “você está feliz de voltar?”. E ela: “sim, Padre”.
Ela andou, caminhou por três dias... mas, quando já estava cansada, resolveu voltar para casa. A liberdade de Deus e a sua liberdade venceram nossos medos, nossas pretensões, nossa posse. Ainda uma vez aquele “eu sou Tu que me fazes”, que aos poucos entra até no fundo dos ossos dos meus filhos, triunfou. Dias muito duros, mas hoje, ver o triunfo da liberdade é, de fato, comovente, porque Anna Maria voltou, está salva. E somente quem ama a liberdade se alegra, porque vê também a salvação dos seus filhos.
Certo, amigos, não é fácil... porque, todos os dias, o Senhor me pede tudo neste oásis de dor... e, às vezes, parece que não darei conta... e, frequentemente, a pessoa pode experimentar aquele sentimento que faz dizer “mas, Senhor, o que queres de mim?”. Mas, no mesmo instante, aquele Tu que domina tudo vence.
Todos os momentos são uma batalha como aquela de Jacó com o Anjo... e é bonito que seja assim, porque é a vida que o exige, porém é necessário que a minha liberdade, no fim, se renda sempre à evidência do Mistério que me quer Seu.
Obrigado, amigos, porque quando rezam por mim e por meus filhos, vocês contribuiram para a volta da nossa Marta e de Anna Maria.
Amigos, desafiem e deixem-se sempre desafiar pela liberdade dos filhos de vocês.
Padre Aldo

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