Entrevista com Claudia Lunghi, feita por Daniele Banfi
Para ver é preciso também tocar? Ao que parece é exatamente assim. Alguns pesquisadores do Instituto de Neurociências do CNR (Consiglio Nazionale delle Ricerche - Conselho Nacional de Pesquisa) de Pisa e Milão (Istitute of Neuroscience - CNR) demonstraram como um sinal tátil é capaz de interagir com uma sinal visual tão logo as duas informações chegam ao cérebro. O estudo foi publicado na revista Current Biology. Para compreender os resultados da análise entrevistamos a doutora Claudia Lunghi, uma das autoras da pesquisa
Doutora Lunghi, no estudo que vocês fizeram, vocês declararam que a descoberta obtida sugere uma revisão dos modelos de base da fisiologia sensorial do cérebro. O que vocês descobriram que pode influenciar estes modelos de base?
No passado, sempre se pensou que os estímulos externos fossem antes elaborados nas áreas primárias do cérebro. Os sons na área auditiva, a vista na área do córtex visual primário e assim por diante. Na visão clássica, os sinais uma vez elaborados eram processados em áreas associativas para dar lugar àquilo a que chamávamos percepções multisensoriais. O que, pelo contrário, está vindo à tona nos recentes estudos é que estímulos visuais e táteis podem ser integrados mesmo sem ser percebidos conscientemente e que a integração pode acontecer já no nível dos primeiros estágios da elaboração visual, ou seja, no nível do córtex visual primário. O nosso estudo demonstra que a interação entre sinais multisensoriais pode acontecer já no nível das áreas primárias, isto é, tão logo as informações sensoriais chegam ao cérebro.
Como vocês realizaram os experimentos?
Para realizar a pesquisa, nos valemos do fenômeno da rivalidade binocular. Se duas imagens diversas são apresentadas ao mesmo tempo aos dois olhos, o cérebro entra em um estado de confusão. Ele não é capaz de combinar as duas imagens, como acontece normalmente quando vemos uma imagem apenas, mas as duas visões entram em competição alternando-se. Não obstante um olho veja uma imagem e o outro veja uma outra, a nossa percepção consciente é uma alternância das duas visões. No nosso estudo, provocamos este fenômeno fazendo com que as pessoas vissem uma grade horizontal com um olho e uma vertical com o outro. Neste ponto, obtida a rivalidade binocular, introduzimos um estímulo tátil. Este, se é congruente com o estímulo visual surpreendido durante a rivalidade binocular, é capaz de reforçar o sinal do estímulo visual a ponto de trazê-lo à consciência. Se o observador está vendo a grade horizontal mas toca uma grade vertical, na maior parte dos casos o domínio do horizontal será interrompido e o observador voltará a ver vertical. Portanto, um sinal tátil pode interagir com o visual mesmo quando este se encontra fora da consciência, demonstrando que a interação tem lugar já no nível do córtex visual primário.
Ter obtido estas informações, além de sugerir uma revisão dos modelos, pode levar a alguma aplicação prática?
A aplicação clínica não diz respeito estritamente à nossa pesquisa, mas o estudo que fizemos levou a novos conhecimentos sobre os mecanismos de plasticidade que se instauram depois de um dano sensorial como a cegueira. Nos cegos, de fato, o córtex visual primário é recrutado para a elaboração das informações táteis. Com a nossa pesquisa demonstramos que as conexões entre os córtex somatosensorial e visual não são criadas ex novo, mas são fornecidos naturalmente no sistema. Estas novas informações podem ser, no futuro, utilizadas por clínicos.
Como vocês pretendem dar prosseguimento aos estudos?
Agora, o objetivo principal é avaliar aquilo que acontece durante os experimentos com a ressonância magnética. Portanto, queremos ver se as medidas comportamentais que obtivemos correspondem a uma atividade aumentada no nível do córtex visual primário. Outro objetivo nosso é ver se o fenômeno de integração visual e tátil acontece também em crianças. Isto porque foi descoberto recentemente que até aos seis anos de idade a integração acontece de maneira diferente da dos adultos, até mesmo de maneira oposta.
* Extraído do IlSussidiario.net, do dia 30 de julho de 2010. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.
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