quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Cartas do P.e Aldo 96





Asunción, 04 de agosto de 2009.

Caros amigos,
Ontem, segunda-feira, depois de 15 dias muito intensos (entre sábado e ontem, segunda, nove Santas Missas, sem contar o resto) e dolorosos para mim, que vi morrerem, em 8 dias, dez dos meus filhos, todos jovens se comparados a mim, peguei o avião e fui ver os Zerbini, em São Paulo. Ida e volta no mesmo dia: 4 horas de voo mais o tempo nos aeroportos. Com eles, fiquei 4 horas – das 16h, quando cheguei, às 20h45, para correr para o aeroporto.
Na casa da Cleuza, nos encontramos todos os amigos da nossa fraternidade. O tema: “como experimentamos a correspondência nestes últimos dias? Exemplos, fatos, perguntas, provocações...”. Foi muito bonito: nenhum discurso, mesmo porque a maioria de nós não é intelectual, mas gente de luta, que se levanta às 5h e vai dormir à meia-noite, inclusive nos domingos. Duas horas de Paraíso – para mim, de repouso – mesmo porque, em Asunción, eu estou sozinho há 15 dias, já que os outros padres estão na Itália. Que bela esta fraternidade na qual, como se diz, nunca se fala do “sexo dos anjos”, nem se repetem frases... já vivemos no país dos belíssimos papagaios tropicais.
Missa e janta. Todas as semanas é assim: a segunda-feira é sagrada e, das 16h às 23h, os meus amigos ficam juntos... e ficariam muito mais... mas, uma amizade é verdadeira quando nos lança dentro do mundo para gritar a alegria de ser de Cristo.
Depois, tive que correr, porque estava quase perdendo o horário do voo, e Marcos e Cleuza – sim ou sim – quiseram me acompanhar. Chegar ao aeroporto foi uma aventura, e peguei o avião quando o check-point já estava fechado e o voo já estava para partir... mas, a Providência...
Cheguei à 1h da manhã e, às 4h, morreu uma filha minha de 20 anos, doente de AIDS, por parada cardiorespiratória. Depois, escreverei contando quem era... mas, morreu como um anjo.
Mando-lhes a foto da belíssima Glória, de 27 anos, que tem metástase. Hoje de manhã, quando entrei no seu quarto, ela me disse: “estou muito bem”... e, outro dia, quando chegou, queria se suicidar.
O problema, amigos, é a fé e a compaixão de que nos fala Jesus.
Olhem para os últimos chegados à Casinha de Belém: Marta, de 15 anos, e a sua filhinha Lucia, de dois meses, 2 kg, sem olhos, sem nariz e um rostinho de camundongo. Que bela! Marta, todos os dias, me diz, orgulhosa: “Venha ver a minha filhinha!”.
Também Rosa, de 17 anos, com metástase, sem uma perna (amputada por causa do câncer). É feliz, quer estar sempre com as crianças... toma morfina. E, finalmente, o último chegado: Marco, de 4 anos, cuja mãe o teve com 13 anos de idade. Tem uma voz super bonita, como a dos anjos. Domingo, quando veio à Missa com meus outros 24 filhos, gritou, do fundo da Igreja, apontando o dedo em minha direção: “Papi! Papi!”.
Amigos, vocês estão de férias, mas creio que eu estou mais de férias do que vocês, com toda esta graça de Deus e com esta recarga de fé e de amigos que sempre me recolocam no ponto outra vez: “eu sou Tu que me fazes”.
Um abraço
Padre Aldo

3 comentários:

Unknown disse...

Caríssimo Paulo,
as cartas do Aldo passaram a ser a primeira resposta do Angelus ao meu dia de trabalho médico. Comecei a me dar conta dos "meus filhos e filhas doentes" e desejei imitar aquela forma atraente de paternidade. Descobri-me também médico de almas e mais mendicante de Cristo.
wandré.

p@checo disse...

Querido Wandré,
antes de mais, que alegria receber o seu comentário... receber a sua visita por aqui.
Sim! É verdade o que diz: "primeira resposta do Angelus"... é bonito também pensar nessas coisas que o Aldo nos conta como uma resposta ao Angelus! O anjo que nos anuncia Cristo presente... e que fica a espera da nossa resposta: "faça-se em mim segundo a Vossa palavra"... o nosso fiat cheio de desejo de imitação.
Um abraço forte em você e na família.
do Paulo

Márcia Cristina Epifânio filipe disse...

Caro Paulo,
passei a admirar o Pe. Aldo quando à a minha querida Maezona Mineira(que coincidentemente é sua mãe) me falou dele. Quando comecei a ler a história bonita de vida e de humanidade, me sensibilizei. Acho que pessoas como ele são instrumentos de Deus na Terra para que possamos ver qual mesquinho somos, em não perder tempo, as vezes, com o irmão que esta do nosso lado. Espero que Deus continue o ajudando para que essa ajuda, nem que seja espiritual, chegue até ele.
Felicidades e abraços. Márcia Filipe (Rio de Janeiro)