quinta-feira, 3 de março de 2011

127 horas: o filme que é uma viagem interior para descobrir a verdadeira liberdade


Por Ezio Goggi

Aron Ralston, chegado à plena maturidade da juventude, grande esportista e amante dos vastos espaços das canyonlands do Utah, entusiasta da ação e da liberdade, decidiu fazer um grande passeio solitário de mountain bike na área do Blue John Canyon. O dia e as paisagens são esplêndidos e ele chega a encontrar casualmente duas belas garotas com quem resolve fazer mergulho num laguinho escondido.
Mas, o tempo estava mesmo muito bonito, por que se contentar com pouco, então? Despediu-se das garotas e, sozinho outra vez, decidiu percorrer uma profunda e estreita fenda que mergulhava no coração da rocha. Descuidadamente, Aron move uma pedra que, caindo e se reacomodando, fica presa contra a parede do canyon prendendo o seu braço direito. O protagonista, que havia se preparado para uma saída de um dia apenas, se viu sem comida e com pouca água: é nesse ponto que começa a odisséia do filme 127 horas
Seria fácil, neste ponto, pensar numa história escura e claustrofóbica na qual o lento aproximar-se do fim é marcado pelo mover-se das sombras e dos pensamentos sombrios do protagonista. Mas, os eventos de 127 horas desenrolam-se de forma muito diferente. A partir do momento do acidente, a narração passa a acontecer sob dois planos distintos: o que experiência presente e o da experiência do passado. Duas lógicas temporais diversas mas, ao mesmo tempo, ligadas indissociavelmente à pessoa que a vive (ou que a viveu).
A experiência do presente, ainda que trágica e aparentemente sem solução, é sustentada pela recordação do que foi vivido, pelas escolhas feitas ou perdidas, pelos encontros e pelos amores começados e terminados. O protagonista, na sua solidão, medita se, de fato, a sua liberdade pode ser reduzida ao percorrer grandes espaços, sem comunicar a ninguém a sua meta, para, dessa forma, afirmar a própria independência, ou se a liberdade está em outro lugar, no afeto dos próprios entes queridos, dos amigos e no olhar de uma garota amada e perdida pelo medo de se vincular. A fenda não é mais um espaço fechado, mas se torna o ponto de partida de uma viagem na qual o si mesmo tenta resistir, para não se perder no delírio de um homem já convencido de morrer.
O filme está enquadrado no gênero “aventura”, mas percorre esse tema de forma um pouco anormal já que apenas em parte pode ser caracterizado por uma ação física: a parte principal da história é um inesperado percurso dentro de si, que todavia não se encerra numa introspecção sem saída, mas se abre sobre a história pessoal do protagonista, relendo-a sob uma nova luz.
Os pareceres sobre o filme foram muitos diferentes, mesmo que, geralmente, positivos; mas a leitura sempre varia de acordo com os críticos. Acredito, porém, que este seja um grande valor do filme: sendo uma história pessoal, inevitavelmente é lida pelo expectador a partir da própria experiência, dos valores e dos sentidos que cada um dá às coisas. Creio que vai agradar aos alpinistas (que poderão encontrar temas que foram tratados, por exemplo, em Tocando o vazio de Kevin MacDonald), aos trekkers e a todos aqueles que não vivem os grandes espaços apenas como um elemento geográfico ou geológico, mas também espiritual.
É notável a interpretação do protagonista James Franco, capaz de uma imitação extraordinariamente realista, que interpreta com grande humanidade os vários estados de ânimo; muito interessante a ideia de confiar a dois diferentes diretores de fotografia a descrição do momento real e a dos flashbacks, o que leva a propor os dois tempos com uma perspectiva diferente.
O diretor Danny Boyle, depois do sucesso de Quem quer ser um milionário?, provavelmente poderia ter filmado qualquer coisa (até lhe propuseram filmar um 007); porém, escolher um filme difícil, contando uma história verdadeira com a qual poderia ter, facilmente, corrido o risco de escorregar no noire ou na espetacularização trágica. Acredito que ter conseguido manter a narrativa de um relato de grande humanidade é já um grande mérito.

* Extraído do IlSussidiario.net, do dia 3 de março de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

P.S.: Traduzi a resenha do filme 127 horas. Ela foi publicada no site da Revista Internacional de Comunhão e Libertação - Passos-CL.

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