sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Da rede à realidade



“A armadilha da instintividade”
Por José Medina

Na escola, muitos dos problemas entre os jovens derivam daquilo que escrevem e leem no Facebook. Falando, depois, com eles, cara a cara, se entende que aquilo que escrevem ali, não seriam capazes de dizer na cara de ninguém.
Todo o mundo da educação nos Estados Unidos afirma que as redes sociais são estupendas, porque permitem uma comunicação facilitada, que derruba os limites de classe e as distâncias. E isto é verdade. Mas, o problema é que se trata de um meio instintivo, que não permite a reflexão, nem favorece o relacionamento interpessoal. Não acredito que se possa manter uma conversa autêntica usando as redes sociais. O que conta é o conceito de “I like it”, “curti”. Tudo se mede a partir do fato de você curtir ou não uma coisa, você curtir ou não as pessoas. Acredito que, para os adultos, seja a mesma coisa: a ideia segundo a qual tudo é automático, tudo é instintivo, é fonte de problemas porque o tempo não existe mais, as pessoas não falam mais! O discurso termina na mensagem de texto. Nos Estados Unidos, a internet já está fora de moda, a comunicação se faz via celular e através do Facebook. O email é um modo já mais profundo de expressão do pensamento, e assume o papel que antes pertencia à conversa.
Educar as pessoas é problemático, porque o instrumento vai no sentido contrário ao esforço educativo. Os três níveis do pensamento humano são: pensar, dizer e escrever. Cada vez que se passa a um nível diferente, o pensamento alcança maior profundidade: pensar consigo mesmo constitui-se num primeiro nível; falar obriga a um diálogo e, por isso, convida a um aprofundamento do pensamento. A escrita obriga a colocar as ideias em ordem. As mídias sociais, infelizmente, reduzem a escrita ao nível mais baixo do pensamento.
Há outro aspecto das redes sociais que contribui para a banalização dos relacionamentos. Para um jovem, no Facebook, não há distinção entre o amigo e o professor: o instrumento faz com que todos sejam uma pequena fotografia. Todas as relações são uniformizadas a um mesmo nível. A diferença construtiva entre jovem e adulto é enfraquecida. Isto gera confusão nos jovens, destruindo o sentido da autoridade e da paternidade. 
Podemos, portanto, utilizar isto como um espaço de educação? Acredito que não seja possível sem que se mude o instrumento mesmo.

“Google ou o professor?”
Por Federico Ponzoni

Sou professor há quase uma década. A tecnologia sempre ocupou a minha reflexão e a minha prática. De um lado, ela entra na escola como instrumento: há alguns anos, quando eu ainda era um seminarista, comecei a ensinar religião, e eu era o único em todo o instituto que usava apresentações em PowerPoint. O efeito era notável: era algo de novo, colorido, divertido. Ajudava a capturar a atenção dos jovens. Depois, o uso de instrumentos como esses se massificou. Passou o efeito da novidade, não bastava mais a simples introdução de um meio novo em sala de aula para educar com eficácia.
Aprendi, portanto, que a técnica no âmbito educativo promete muito, mas mantém pouco. Por exemplo, no Chile, onde estou em missão, os computadores foram introduzidos em sala de aula há dez anos, mas os resultados nos testes internacionais (PISA) não mudaram muito. Somente há poucos anos é que foram introduzidos os softwares didáticos que usam amplamente técnicas de programação que dão resultados tangíveis, sobretudo em matemática. Os estudos feitos até então demonstram, porém, que a simples introdução do software produz um crescimento vacilante dos resultados em matemática. O software, pelo contrário, unido ao aperfeiçoamento do docente e à melhora da didática, produz resultados impressionantes. Técnica ou não técnica, o homem continua sendo o centro do processo educativo. 
Não é tudo. Os estudos mais recentes, tanto em neurobiologia como em mídia, sublinham que a introdução de meios digitais produz uma mudança cultural muito significativa: um “nativo digital” pensa de modo diferente de alguém que só entrou no mundo digital quando adulto. Isto gera graves mal-entendidos entre docentes e alunos: aquilo que o professor diz é frequentemente visto pelo aluno como irrelevante ou inútil (“O professor está me dizendo coisas que posso encontrar no Google... por que, então, eu preciso ficar atento?”) e o professor encontra um aluno distraído, preguiçoso, sem interesse e, por isto, se sente frustrado. Então, é necessário redescobrir o verdadeiro papel do educador. O educador é aquele que sabe transmitir aquilo de que os nativos digitais precisam: uma razão para viver.

Uma carta de pouco valor
Por Carlo Fumagalli

Hoje, vejo em muitas pessoas (não apenas nos jovens) uma notável dependência dos meios de comunicação. Fico tocado com o senso de vazio, de desorientação, que as pessoas têm quando procuram alguém pelo celular e o encontram desligado. Na Hungria não existe o serviço de sms que avisa quem ligou para você. Desencadeia-se, por isto, a fobia de não conseguir falar com aquela pessoa. Que se torna agitação, ansiedade. Em mim, esta dependência é um pouco limitada. Mas, tenho uma missão muito “móvel” e, frequentemente, estou rodando: noventa por cento das ocasiões missionárias que tenho se passa pelo celular. Há, portanto, um aspecto positivo, de um ponto de vista “missionário”. Há o risco de degenerar, mas é uma comodidade enorme, desde que seja apenas o prelúdio para um encontro pessoal. É como, num jogo de baralho, uma carta baixa que você joga para ver o que os outros jogadores têm na mão. Certamente não será com ela que você vai levar para a casa o resultado, mas pode, certamente, facilitar o caminho.
Com o email é diferente. Quase nunca respondo a um pedido diretamente pelo email: convido o outro para nos vermos e conversarmos. Tem nisso uma questão lingüística, mas sobretudo parto da consciência de que não tenho a verdade no bolso, que possa ser confeccionada e enviada por email. Acredito que é muito interessante estar juntos, dar alguns passos juntos, viver juntos um momento de relaxamento...
Tudo isto é possível apenas no relacionamento pessoal. Em geral, precisamos do silêncio, do tempo de escuta do outro, algo que não seja um relacionamento mediado pelas tecnologias ou queimado nos tempos breves. Facebook é um exemplo evidente: uma garota, em dez segundos, convida trezentos “amigos” para um concerto. Depois, no concerto, aparecem apenas em dois que, não por acaso, são os dois para quem ela também telefonou. A ação pessoal é sempre mais resolutiva.
Tenho uma prova evidente disto quando me acontece de sugerir algo para ser lido. Às vezes, para que a pessoa possa receber logo depois do nosso encontro, ligo o computador, anexo o arquivo e envio. Mas, o fracasso é quase certo: entre as centenas de mensagens que recebe, o meu correspondente, no máximo, vai folhear as minhas páginas por uns trinta segundos. Outras vezes, pelo contrário, experimentei dar um livro ou uma fotocópia: é uma coisa completamente diferente. O papel fala. É como se eu dissesse para quem eu tenho diante de mim: “Depois da nossa conversa, pensei em você, rezei por você, trouxe na memória aquilo que você me disse. Procurei um livro e o folheei até encontrar aquilo que parece ter sido escrito exatamente para você; dá uma olhada, sublinhei alguns trechos há alguns anos, dou para você algo que é parte de mim...”.

O que procuramos
Por Giovanni Musazzi

Os lados bons da tecnologia são evidentes: organizo uma viagem em cinco minutos, encontro, sem me mover, livros que me são úteis, convido para um feriado com um único email, economizando quarenta telefonemas. Mas, assim como as coisas boas são tão óbvias, parece-me que se percam de vista os problemas. O uso adequado da internet não é o abuso. Mas, quando se está cego, o abuso está na próxima esquina.
O primeiro risco grave diz respeito ao uso do nosso tempo. O tempo tem um valor. Como tudo é fácil, o risco é que aquilo que deveria me ajudar a economizar tempo, na realidade, toma uma quantidade enorme de tempo. Do mesmo modo, o estar sempre disponível é um peso. Chega um email e, depois de um minuto, um sms no qual avisam que você deve dar uma olhada no email, e dez minutos depois telefonam para perguntar se eu li... e, no máximo, se trata de algo que vai acontecer daqui a duas semanas. É uma ansiedade: tudo agora e tudo imediatamente, tudo sempre urgente.
Frequentemente, de outro lado, perdemos a noção de que do outro lado da linha ou da rede tem uma pessoa. Usamos a tecnologia para procurar alguém não porque nos interessa aquela pessoa, mas apenas porque, naquele momento, precisamos que haja uma pessoa imediatamente disponível para poder descarregar sobre ela o fato que nos sentimos tristes, que estamos parados num engarrafamento na estrada, que estamos fazendo um trabalho tedioso. No fundo, por outro lado, é quase indiferente quem está lendo ou escutando. Ninguém me responde? Telefono para outra pessoa. Ou então, um belo sms grupal: alguém há de me responder! Quando, pelo contrário, vou encontrar alguém, tenho aquela pessoa diante de mim e basta. As pessoas, aqui no Portugal, têm uns três chips de celular, utilizando três empresas de telefonia diferentes. O resultado disso? Mexericos e um montão de dinheiro gasto com contas de celular.
Será que precisamos tanto de todas estas palavras? Precisamos tornar tudo público, disponível online? Eu pedi a muitas famílias próximas que trocassem as fotos privadamente, e que não as publicassem na internet. De fato, tem uma forte tendência a recorrer ao virtual, olhar as fotos e ler os comentários, mais do que viver uma experiência direta. Eu gostaria de viver a vida, e não de viver como um substituto. 


* Extraído do site da Fraternità San Carlo, do dia 5 de outubro de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco

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