segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Cartas do P.e Aldo 171





Asunción, 19 de dezembro de 2010.

Caros amigos,
Bom Natal! Particularmente aos muitíssimos amigos que, com seus emails, me confiaram suas dores, dificuldades, seus sofrimentos e, frequentemente, sua falta de vontade de viver. Para mim, foi uma graça, porque seja quem for que estiver sofrendo eu o sinto comigo e com o mar de dor que me circunda, da dor de Cristo, daquilo que falta à paixão de Cristo pelo seu corpo que é a Igreja. Agradeço a vocês de coração, porque as feridas que carregam não apenas me impedem de ser um burguês, ou seja, um homem sem pergunta, sem dramaticidade, como também me ajudam a viver dentro das circunstâncias da vida com os olhos fixos no Mistério. É como se o dor de vocês, a nossa dor, me tornasse sempre mais consciente do significado de estar suspenso sobre um cheio, sobre uma certeza.
Confesso a vocês que todas as noites, quando já tarde, vou dormir, depois de ter visitado as várias obras da paróquia onde vejo e sinto somente a dor dos meus filhos, dos recém-nascidos abandonados, das meninas vítimas da violência, dos doentes terminais e dos velhos recolhidos das ruas, reconheço como o Mistério domina a minha vida, enchendo-a de paz. Que bonito é ser tomado, dominado por aquele “Tu” a cujos olhos sou precioso e digno de estima, porque sou Seu, como nos recorda o profeta Isaías. Como eu gostaria que as muitas pessoas deprimidas, cansadas de viver, vítimas das mil fantasias, que conheço muito bem, reconhecessem, mesmo quando a angústia parece sufocá-los, que, seja como for, o Mistério é um Fato presente, é um abraço que nunca permite que nos percamos. O problema não é a dor, a depressão, a doença, mas é a liberdade de reconhecer naquele “Tu que me fazes” a própria consistência. Há momentos em que não vejo nada, mas o juízo é claro e eu repito para mim mesmo continuamente: “Tu, ó meu Cristo!”, e sempre reencontro a energia para caminhar.
Peço a vocês, enquanto peço por mim mesmo, de não colocar os “se”, os “mas”, os “porém” entre Cristo e nós, porque isto seria a única grande fraude e perderíamos a festa da vida. O Mistério ama quem se arrisca, que não tem medo da realidade, e em geral se diverte permitindo-nos chegar até à borda do abismo, mas depois, de repente, quando tudo parece perdido, nos salva, pegando-nos pelos cabelos. Há vinte anos experimento este fato mesmo em nível econômico. Pensem nas centenas de milhares de euros de que precisam estas obras! E, no entanto, chega o último dia do mês e a Providência chega. No início, quem trabalhava comigo se assustava, a administração entrava em crise, enquanto que, para mim, era tudo simples e ainda o é: “Senhora (disse à administradora), estão faltando dois dias para pagar o salário dos 180 dependentes do Mistério, único chefe destas obras; por isso, por que você se preocupa?”. E no dia seguinte, a Providência chegava com o dinheiro necessário – e nada a mais ou a menos. Mesmo com respeito a isso o Mistério me mantém sempre suspenso e, portanto, sempre mendicando. Não sei como pagarei o salário de janeiro às 180 pessoas, ou melhor, famílias, mas, por isto, não perco o sono, porque tenho a certeza absoluta de que o Senhor, aquele “Tu que me fazes”, no momento certo, estará ali para pagar. Que liberdade eu sinto quando estou diante, diante daquele Tu que me domina, me abraçando.
Ontem, Ele me deu dois novos filhinhos. Olhem para eles nas fotos. São gêmeos, foram abandonados por sua mãe e, por causa dos maltratos que sofreram da “mãe”, ambos possuem uma paralisia cerebral, de forma que isso era motivo suficiente para recebê-los. Têm 1 ano e oito meses e pesam, cada um, 6 quilos. A história deles é de um sofrimento terrível. No entanto, o Mistério ocupou-se deles e os deu a mim. Na primeira noite, choraram durante toda a noite, mas nesta última noite, já estavam mais tranquilos entre os meus braços.
No fundo, se o nosso abraço é o fruto da experiência do “Tu que me fazes”, ele se transmite como que por osmose mesmo a eles, cuja inocência foi lacerada pelas violências de todos nós, quando nos esquecemos de ser relação com o Mistério.
Olhando-os, penso naquela pobre mulher que, certamente, mesmo ela, terá sido vítima de outra violência. Confio-os às orações de vocês, assim como confio a terceira Casinha de Belém e a nova casa para as meninas violentadas e grávidas, que iremos inaugurar na vigília de Natal.
Como vocês podem ver, Jesus me enche de presentes, presentes que também são para vocês. É mesmo bonito ser queimados pelo amor por Cristo, porque, assim, o coração queima de amor pelo homem.
Bom Natal.
Padre Aldo

P.S.: Amigos, desculpem o italiano, mas, não sabendo usar o computador, confio-me ao excelente secretário que faz o impossível para me traduzir. Olhem para a essência, para o coração.

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