terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Amar a literatura? Desde quando a emoção educa alguém?


Por Laura Cioni

Caro diretor,
li no IlSussidiario.net de ontem, dia 21 de fevereiro de 2011, o artigo de Daniela Graffigna sobre o encontro de apresentação de um livro de Davide Rondoni acerca do ensino da literatura na escola.
Declaro previamente que na escola em que eu estudei – nessa sim – nos faziam estudar história da literatura prescindindo do conhecimento dos textos, e afirmo também que a escola na qual ensinei, mesmo que por mérito dos famigerados estruturalistas, sugeri a centralidade da leitura do texto na didática do italiano e também do latim, sem, com isso, impor método algum (nem estruturalista, nem psicanalítico, nem filológico). Portanto, parece-me que o campo continue claro para a inteligência do professor, para a sua preparação, para os seus gostos, também.
Desconfiarei do uso mágico de certas palavras, como por exemplo da palavra acontecimento. De acontecimento na vida, de fato, há poucos, por sorte. Se fossem muitos, não conseguiríamos suportar o peso. Por isso, seja a leitura obrigatória dos atuais regulamentos, seja a leitura facultativa proposta por Rondoni, não protegem do tédio que está ligado a todo trabalho humano que queira ter alguma dignidade. Quem quer que tenha feito uma monografia de final de curso – que, normalmente, é o empenho mais longo do período universitário – sabe o quanto de tédio exista nesse trabalho e que é necessário atravessar para que, num certo ponto, aconteça algo de semelhante a uma ideia original, a uma hipótese convincente, a um sobressalto do coração que indique como prosseguir. Acredito estar dizendo coisas muito banais, mas, mesmo por isso, muito pouco ditas. Por isso, o estudo, no sentido latino da aplicação da qual nasce o amor, é condição necessária na escola. Ou será que queremos continuar a perseguir o sonho de pequenos estetas, falsamente amantes e realisticamente emotivos?
Por favor, coloquemos os pés no chão. Não para a defesa do statu quo, nem para a defesa do italiano, mas para a defesa da educação, de que tanto se fala sem que se a preencha de conteúdos, por aquela humanidade que queremos para nós e para os mais jovens capazes de tenacidade, de determinação, de sacrifício no enfrentamento dos problemas típicos da difícil prova de tradução de latim, leve treinamento para as bem outras adversidades da vida.
Não especialistas, mas amantes, disse Rondoni. Mas, o amor não é apenas um se apaixonar, é também vida comum, com toda a minuciosa gama de ações, silêncios, ansiedades, raivas, paciências que ela suporta.
“O amor das letras e o desejo de Deus”: é o título de um famoso ensaio, recentemente recordado também pelo IlSussidiario.net; fala da cultura humanista na vida monástica. Quantos monges copiaram e recopiaram, por séculos, o De Amicitia de Cícero para que, no século XII, a escola cisterciense tirasse dali a doutrina da amizade espiritual, origem distante, mas real, da poesia romântica? E os grandes mestres daquela doutrina não terão, talvez, se esforçado muito para aprender a retórica de Cícero antes de escreverem como escreveram? Não terão sido obrigados a ler Ovídio, antes de recusá-lo como um mau professor? Quantos acontecimentos terão vivido neste trabalho incessante, em seus scriptoria escuros e frios?
Por favor, tenhamos a humildade de aprender com os grandes o pudor de não usar palavras verdadeiras para comunicar uma emotividade impura, porque apenas momentânea, não sedimentada, sempre à procura de confirmações, sempre angustiada por repetições. Parece-me que a palavra acontecimento seja uma dessas. E assim, a estragamos. Com o que a substituiremos quando nos entediarmos com tudo?


* Extraído do IlSussidiario.net, do dia 22 de fevereiro de 2011. Traduzido por Paulo R. A. Pacheco.

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