Por Paulo R. A. Pacheco
Aquilo a que alguns vêm chamando de "vitória jurídica", no caso da aprovação, por unanimidade, no STF, da união estável homoafetiva, só poderia ser assim chamada caso existissem duas forças jurídicas se antagonizando. O que não é, nem de longe, verdade: lembremo-nos de que a Carta Magna brasileira deixa bem claro aquilo que deve ser chamado "casamento", aquilo que deve receber o título de "família", eliminando, antes de qualquer conflito, toda e qualquer possibilidade de antagonismo - essa, por sinal, é a grande virtude de toda prescrição, vale dizer, descrever a ordenação dos fatos legais a partir da normalização, ou seja, da suposta ausência de casos contraditórios (não é preciso ser um grande sábio para saber que toda verdadeira norma, diga-se de passagem, não vem depois do delito, não é fruto do delito ou da necessidade de corrigir o delito a posteriori... a norma vem antes do delito e depois da identificação do Bem e do Justo e do Verdadeiro... é fruto da razão e não da reação). Lembremo-nos também de que não há, em parte alguma de nossa Constituição, impedimento implícito ou explícito para que, nos termos da lei, se estabelecessem contratos, de que natureza fossem, entre pares de mesmo sexo. Lembremo-nos, outrossim, de que o casamento civil ou o reconhecimento da união estável, para fins de proveito de benefícios, nada mais são que contrato registrado em cartório.
A vitória, evidentemente - e que, inclusive, é mister afirmar, fere a Constituição ao mudar o estatuto da célula social e fere o direito natural, ao estabelecer a definição de família a partir da opinião de um grupo (majoritário ou não, não interessa) - não é jurídica, mas ideológica. Vejam-se os votos proferidos pela totalidade dos senhores ministros do Supremo: não há um único caso de exercício inteligente da argumentação jurídica. Os "argumentos", quando muito, são tentativas medíocres de poetização do politicamente correto ou arremedos de justificação psicanalítica para o injustificável. Sim, a vitória foi da boçalidade e da ideologia. E não é preciso ser um jurista, um advogado, um "entendedor" de leis, basta ter um cérebro e saber usar a razão - atividade, a propósito, cada vez menos comum entre os homens na contemporaneidade.
Triste ver que o Supremo Tribunal Federal é feito de uma única voz... pior, de uma altissonante voz unida pela homologação do pensamento.
Vencendo-se essa primeira batalha ideológica, abre-se o precedente para que, aos poucos, se estabeleçam os "argumentos" (se é que se pode usar esta palavra no caso daquilo que nossos potentados do Judiciário vomitam) sobre os quais se construirão outras vitórias ideológicas, como a descriminação do aborto. Foi assim, no passado, quando a ideologia pró-divórcio venceu uma primeira batalha em prol do Estado Laico... plantando o conceito falacioso de que laicismo é sinônimo de laicidade. E o Estado, finalmente, depois de ter invadido nossos lares e mentes, invadirá nossos corpos... E as mulheres, "donas de seus corpos", descobrirão tarde demais que não dominam nada de si. E os homens e mulheres, finalmente livres para fazerem o que quiserem do "bônus" que carregam entre as pernas (metáfora usada pelo "ministro poeta" Ayres Brito), descobrirão tarde demais que o que fazem na intimidade não tem nada de privado.
Aumenta em mim o nojo por este estado de coisas. E temo pelo momento em que - talvez um pouco paranoicamente demais, é verdade - dizer do "nojo" pela mediocridade e pela patrulha do pensamento será crime passível de morte (e não exagero em dizer "morte"... porque todos sabemos que ela não precisa ser explicitamente corte de cabeças, à la iluminismo francês... basta que seja uma guilhotina usada contra a razão para que haja morte do quê de humano que define a pessoa).
Dixit.
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